domingo, 22 de novembro de 2009

Filme.

Culparia o cansaço de suas pernas finas, ou a vida, ou a falta de apetite. Quisera poder segurar tudo em suas mãos, mas cada uma das coisas dava um jeito de escapar-lhe pelos dedos. Talvez fossem como passarinhos, e a força com a qual segurava-as ia além daquela pretendida. Apertava-as de coração apertado. Quisera que sua vida fosse uma coleção de colares de pérolas e belos penteados, acompanhados de sorrisos imóveis e acenos repetititivos. Uma vida na qual os cordões não rompessem e os fios de cabelo não prendessem-se nos lábios. A vida que tinha era-lhe indigesta, exaustiva. Vivia a tropeçar nas contas que escapoliam de seus colares, a cegar-se com os fios de cabelo nos olhos. A vida dos outros era soma de momentos. A sua fora, até então, a soma de acidentes. No encontro de um acidente seu com o momento de outro, perdeu as raspas de fôlego que entravam por sua boca. Julgou aquela sensação como um momento. Sua vida era, agora, a soma de trilhões de acidentes com um momento só, que valia por toda a cegueira e as cascas de ferida. De cabelos despenteados e com um colar sem contas, entregou-se a aquele momento na esperança de virem outros. Prendeu aquele momento em suas mãos. Mastigou-o até os próximos. Um encontro, um momento. Mais encontros, mais momentos. Sentia como se segurasse uma constelação em suas mãos pequeninas. Em um novo encontro, em um novo momento percebeu que apertou-o com muita força, o bastante para prendê-lo antes de escapar, o bastante para que esse aperto parecesse um erro. Apertava-o de coração solto. Quis libertá-lo, mas não sabia como, já que estava tão grudado em suas palmas que, deixaria-o sem rumo, ficaria sem jeito. Culparia o cansaço de suas pernas finas, a vida, a falta de apetite. Cansou-de mastigá-lo. A vida de antigos acidentes e novos momentos era bem digesta, sem tempero. Cansou-se dela. Queria as contas no chão e novos tropeços.

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