terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

Sem ter você vou mais só.

Olhei aquele velho retrato, vi nele aquele nosso passado. Roubei uma dúzia de flores, deixei que apodrecessem. Cavei um buraco de pequeno porte, nos joguei dentro dele e cobri com areia e cuspe. Alcancei um velho vaso quebrado, coloquei três gostas de água e depois posicionei as flores dentro dele de modo desorganizado. Coloquei o vaso em cima do buraco já tampado, deixando com que ele caísse um pouco para a esquerda. Peguei um lenço desbotado e expurguei algumas lágrimas, o joguei no chão e fui embora. Não foi assim tão difícil fingir que já nos tinha sepultado.

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

Procura-se.

Estava andando por aí, deslizando entre a chuva e o concreto. Queria ver as estrelas, mas não enxergava o céu. Catei alguns dos papéis que encontrei no chão, mas nenhum deles me deu alguma pista. Vasculhei uma lixeira, mas não a encontrei por ali. Tentei gritar por ela, mas minha voz se perdia no caminho. Pensei em fazer algumas ligações e ver se alguém sabia de seu paradeiro, mas ninguém nunca a conheceu. Escutei uma porção de sirenes e me enchi de esperança e medo, será se acharam minha alma vagando sozinha por aí?

domingo, 15 de fevereiro de 2009

Para alguém.

Ela só abria revistas e jornais para ler o horóscopo. Não acreditava em Deus, e achava que era recíproco, achava ainda que ele tinha se esquecido dela. Acordava com o pé direito e acendia logo um cigarro. Ela olhava nos olhos procurando as almas, mas nunca tinha visto a sua através do espelho. Ela olhou para mim fingindo que olhava para outra coisa, eu olhei para ela e não conseguia olhar para mais nenhuma outra coisa. Eu estendi a mão, e ela levou consigo o coração. Ela sonhava, mas achava que nunca iria além. Ele gosta de mim, eu gosto dela e ela não gosta de ninguém.


And she just might get you lost.
And she just might leave you torn.
But she just might save your soul
if she gets you when she gets you any closer.
(Rooftops and Invitations - Dashboard Confessional)

sábado, 14 de fevereiro de 2009

Garoa e solidão.

Desliguei todas as luzes para minimizar o estrago. Desabei em um suspiro. Achei ter sugado todo o mundo em um trago. Acorrentei-me dentro de meu peito. Segurei uma batida bem forte, evitei sair boca afora. Com algum esforço uni minhas mãos, mas a vontade não bastou para mantê-las grudadas. O coração ia e voltava, ia e voltava, ia e voltava, e ia e voltava...eu suava. Devia estar vermelho como tudo a minha volta. Não conseguia desprender-me das correntes. Fechei os olhos. Agora era mais do que fato. Sequestrei-me.

Espelho.

Trancou-se em um quarto de espelhos. Focou-se em seus olhos. Tinha muitas perguntas e medo das respostas. Sabia da verdade, mas encontrava conforto em qualquer mentira. Queria sorrir, mas não tinha motivo. Não queria chorar, mas só tinha motivos. Enxergava-se por todos os lados. Milhares de si mesmo, assim como era do lado de dentro. Focou-se ainda mais em seus olhos. Tentou decifrá-los feito enigmas. Não obteve sucesso. Tentou somar-se feito números. Nunca obteria sucesso. Esqueceu-se dos olhos, olhou para o lado de dentro, ajoelhou-se perguntando: por que diabos eu destruo tudo o que toco?!

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

Desconcerto.

Sentou-se na parada esperando que passasse. Não estava a espera de um ônibus específico, e também não esperava ali até que a chuva passasse. Queria sim algo que o transportasse para outro lugar, mas não era um simples ônibus que o levaria até lá. Tinha sim buscado abrigo, mas não para proteger-se da chuva. Buscava proteger-se de si mesmo, ou daquilo que havia se tornado. Tinha pensado em atirar-se de uma ponte, de um carro, do mundo, mas não era esse tipo de adrenalina que faria com que sentisse seu coração batendo forte. O que havia perdido não era de seu conhecimento, ia além do que seus olhos acinzentados podiam ver. Sentia frio, sentia o vento, sentia-se só. Não enxergava a rua tentando enxergar-se. Era um corpo mais morto do que vivo, um coração que não conhecia o amor.

domingo, 8 de fevereiro de 2009

"Não te quero" (sussurrado)

Abri o armário e deixei que todos os esqueletos caíssem. Aquele beijo, eu não te dei, foi roubado. Peço que por favor o devolva, ele pertence a outros lábios.

domingo, 1 de fevereiro de 2009

14:13

"E se..." disse repetidas vezes enquanto via as gotas escorregarem por minhas mãos. "E se eu voltasse atrás?", "E se eu escrevesse uma canção?", "E se eu recitasse um poema?". O presente vira passado, mas nem isso faz com que a gente se esqueça dele. Não entenda como se eu quisesse ter esquecido o passado. Eu só queria poder ainda olhar em seus olhos e me ver neles, queria que fosse você agora segurando minhas mãos. Deixe o telefone tocar, a chuva cair, o sorriso fechar, mesmo que seja tarde demais para chorar. E se tivesse alguma coisa que eu pudesse fazer para voltar no tempo, você me diria? Porque eu faria, juro que faria.


Something passed right through me,
Someone came and threw me,
No one ever knew me,
People shadows to me.
There's no doubt about us,
Time is running out around us
I can't cry,
It's just something in my eye.
(Something In My Eye - Turin Brakes)

Fôlego.

Recuperei a alegria depois de algumas taças de vinho, conquistei alguns impérios, gastei algum dinheiro, presenciei alguns muitos adultérios. Olhei nos olhos, mas procurava as bocas, encontrei algumas delas, degustei de seus mistérios. Escutei sons, que fingi reconhecer como palavras. Entreguei alguns sorrisos, roubei outros. Perdi a cabeça, a carteira, e de quebra, o fôlego.

Etiqueta.

Roubou-me um beijo, forçou um abraço. Entrelaçou bem nossos dedos, talvez para que os meus não escapassem. Olhou-me nos olhos e disse tudo que um coração podia dizer. Fechou os olhos, esperou escutar ao menos o mesmo. Fechei os olhos, fingi dizer ao menos o mesmo. Cuspi as palavras vazias, deixei que o vento levassem-nas para seus ouvidos. Abriu os olhos, deu-me um sorriso. Abri os olhos, forcei um sorriso. Ela não precisa saber que só a amo por etiqueta. Precisa?!