sexta-feira, 26 de outubro de 2007

Cidade grande.

Atordoada, senta-se no primeiro banco que seus olhos puderam alcançar e tenta recuperar o fôlego. O ar entra e sai como punhais em diferentes pontos de suas costas. Suas pálpebras se movem grosseiramente tentando clarear a vista. As pessoas vão e vem, mas ninguém a nota, ninguém ousa notar. O seu corpo pesa, suas mãos suadas escorregam do rosto para a nuca. O tempo passa, o tempo passa e isso dói, o tempo dói. O tempo tem um gosto amargo em sua boca.
A solidão invade cada um de seus milhares de poros e um vazio preenche o peito. Multidões vão e vem, desviando olhares, buscando conforto no tique-taque dos relógios de pulso, nas mensagens antigas de celular. A indiferença lhe corta a garganta, até que a dor do corte, já tão profundo, faz tudo se estourar em um grito, um grito que cala lá dentro e assusta lá fora. As pessoas ousam olhar. Olhares curiosos, desaprovadores, assustados. Olham com pena. Ela não buscava pena.
Um homem de terno e gravata joga-lhe uma moeda. Ela dá o troco, abre sua níqueleira e atira uma moeda canadense em suas costas. O homem, assustado, acelera o passo e se perde em meio a multidão. A última coisa que ela queria é que sentissem pena. Ela sabia que pena é como olham quando não compreendem, e ela buscava compreensão, que lhe faltou a vida inteira.
Perturbada, irritada, vulnerável, se deita no banco e deixa o braço cair. Os sentidos começam a se acalmar. Fecha os olhos e tenta se distrair com alguma música. Não há música. Ela sente alguém se aproximar, uma sombra fica entre seus pés e o sol. Se prepara então para ser expulsa do local, ou mais educadamente, para se retirar, com um discurso que visa dizer apenas que banco de praça no meio da nata da sociedade não é lugar para ficar vagabundeando.
Ela abre os olhos, um rapaz de cabelos grisalhos se senta na ponta do banco, e lhe oferece um copo de água. Ela balança a cabeça, recusando. Ele segura sua mão e tenta fazer com que ela se sente. Depois de muito insistir, ela cede, e os dois ficam sentados, lado a lado. O coração dela ainda bate agitado. Ela o observa minuciosamente. Até que seus olhos vão de encontro ao ombro dele, que a atraí ensandecidamente. Ele segue uma viatura da polícia com a cabeça, e nesse mesmo momento, a atração é tanta, que ela se deixa encostar a cabeça em seu ombro. Os olhos dele, sorridentes, se encontram com os dela, satisfeitos. Seu coração, agora se acalma, e o tempo passa na medida exata. É como se, finalmente, ela se encontrasse.