sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Gratidão Não É Amor.

Eu sonhei, nessa noite, que tudo era diferente. Eu acordava, e você estava logo ao lado. Nenhum de nós se sentia sozinho. Ninguém se lembrava que, na realidade, era impossível escapar disso. Aquele papo sobre estar só acompanhado...você acordava, e também levava um susto. Não esperava me encontrar ali. A gente se estranhava um pouco. Mas não demorou muito e as mãos já reconheciam o espaço dos dedos. A gente reafirmava aquele espaço no mundo. Os lábios estiveram tímidos, mas logo arriscavam uns movimentos. Eu levantava e ia para a cozinha passar um café. Você vinha logo atrás, parecia sentir medo de que eu me perdesse pelos cômodos e nunca mais aparecesse. Você andava na ponta dos pés, como se sempre tivesse sido bailarina, e eu, sempre uma razão para te fazer levitar. Você me dizia para maneirar na quantidade de café. Precisávamos evitar desperdícios. "Você sabe que o mundo está engolindo a si mesmo, não sabe?" e o brilho dos seus olhos parecia se distrair um pouco, quase ir embora. Café para duas canecas cheias e um repeteco, se você quiser, depois. Café requentado tem gosto de amor, amor quando está naquele momento de não se importar com mais nada. Quando uma pessoa está tão, decididamente, focada na outra, que não se interessa se as propriedades das coisas não estão mais lá. Nem tanta cafeína, nem tanto calor, nem gosto, nem tanto cheiro. É só para enganar a boca quando ela só está interessada na boca do outro - e não pode engolí-la. Quando um quer engolir ao outro e a si mesmo. É preciso se distrair para evitar desperdício.Você escutava tudo que eu pensava. No sonho, não haviam pensamentos escondidos. Uma terceira voz anunciava tudo. A gente se comunicava, e nem sempre através das nossas vozes. Você se debruçava sobre a varanda. Dizia não se lembrar daquilo tudo, de como era tão lindo. Eu temia que um vento forte, ou uma cãibra, te fizessem desequilibrar e você caísse. "Não é tão alto aqui do décimo andar", você disse. E ria, gargalhava, depois respirava fundo, e me olhava tão lá dentro, que eu ficava mudo. Faz tanto tempo desde que a gente se deu bem. Tanto tempo desde que a gente se deu, também. A gente se entregou. Acordei assustado, com a cama toda molhada de suor, não teve nenhuma força externa, você simplesmente abriu os braços e pulou. Quanto tempo até parar de doer?

terça-feira, 11 de dezembro de 2012

Origem/Destino.

A garganta arde, queima, e eu sinto o muco querendo escorrer. Eu olho nos seus olhos e não estão mais ali. São só ausência. Partes suas que foram tudo, foram tanto, mas se cansaram. Existe um potencial, um quase-limite, uma forma de ser, e ser mais ainda, e espichar-se mais um pouco, e não desistir, até que se esgotem as forças. Mil e umas maneiras de tentar. Uma insistência que se prolonga. Afinal, a força pode brotar de diversos cantos. E nem sempre seus pontos de foco deixam que se atrapalhem, ou se anulem.
Sua vida colidiu com a minha. Caímos, e o desconforto em estarmos ambos espalhados pelo chão, trouxe conforto, afinal. Afinal, muitas coisas começam erradas, mas acabam encontrando formas de parecerem certas. Muitas coisas parecem erradas, e não são. Muitas coisas são incontáveis coisas, melhor não tentar definí-las aqui. O que precisa ser levado em consideração é que algo conspirou para que estivéssemos os dois no mesmo lugar. Em um mesmo instante. E como dois corpos não podem ocupar um mesmo lugar no espaço, uma força extraterrena sugeriu que nos tornássemos um.
Não acredito em Deus. Não sei se ele acredita em mim. Não acredito em coincidência. Na verdade, não consigo me lembrar no que acreditava. Mas posso fingir que sim, se você quiser...
Se precisar que eu acredite.
Ainda bem que seus joelhos eram treinados a suportar pancada. Ainda bem que eu caí de bruços logo depois de você. E que eu era mais leve. Não te machuquei. Foi como um abraço que não quer se soltar. Ficamos desacordados, mas logo risadas. Logo risadas, choro, agonia, incompreensão. Ainda bem que humanos, então nada de raso.
Seu cabelo, sua pele, suas pálpebras, seu mau gosto musical.
A memória, a lembrança, a inconstância, as botas sujas de barro. Os dias de chuva. Os dias de sol. Os dias que entravam e saíam sem serem convidados. As páginas sendo rasgadas do calendário.
A vida, às vezes, dá tantas voltas que parece que vai se enforcar.
Acho que acredito nisso de encontro. Que é algo definitivo. Que ninguém sai da vida de ninguém, pelo menos não permanentemente. Existe, ao menos, um lugar onde todos se encontram.
Que não demore tanto. Existem diversos lugares aí pelo mundo.
Castles are built from silence.
A garganta arde.
Escrever não é trapacear...