sexta-feira, 29 de outubro de 2010

W2.

Você se foi. E eu chorava, e gritava, como se algum membro estivesse sendo amputado à sangue frio, sem anestésico ou sem que eu pudesse apertar forte uma mão. E me doía tanto. E me doía de um jeito tão forte e tão vivo. Que, pela primeira vez, me senti perto do céu. Você se foi, e eu te vi virando as costas para mim e ficando de frente para ele, subindo nas pontas dos pés, colocando as mãos por detrás do pescoço dele, e selando um compromisso renovado. Você se foi e eu me senti traído. Enganado, despedaçado, incompleto, eu me senti como se você fosse propriedade minha, com meu nome gravado em alto relevo em sua pele parda. E minha infelicidade quis chegar perto e construir uma sua, chegar perto e te puxar pelo braço. E dizer que você era minha, não importando se você não soubesse. Que era minha porque eu escolhi e decidi sozinho. Que eu-não-te-deixo-ir-embora, que você-precisa-dos-meus-braços-dos-meus-beijos-dos-meus-espasmos. Mas seu sorriso foi, pela primeira vez, tão branco. Que eu pude até pensar que, apesar de mim, era ali que você queria estar. Mesmo antes tendo me procurado, e apenas comentado sobre o dia, e eu tendo entendido que você só sentiu vergonha de dizer que me descobriu depois de tanto tempo, assim por acaso. Eu só via o que queria ver, ou algo asssim. Vocês saíram de mãos dadas, e minha vontade maior era pegar o carro e ir atrás, buzinar para que você me visse, e entrelinhas pedisse por uma palavra. Eu queria te puxar para mim, consciente de que meu buraco era negro, e que podia te encontrar e te perder para sempre. Eu fiquei parado, estático, mortificado. E depois chorei. Eu fiquei chorando dores de um amor que nunca foi meu.

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Oceano.

Eu voltaria para te ver abrindo os braços para o Cristo, tomando banho de mar, entornando garrafas, ou me amando apesar de mim, como costumava dizer apesar de mim, eu te amo. Eu viveria de lembranças, mesmo tendo me dito que, de passado, só vivem os museus. É fraco, mas não dá para se esquecer. A gente tenta, vai pegando borrachas, mãos, aviões, vai esquecendo alguns dos detalhes do rosto, às vezes até confundindo com outro, mas fica. Mesmo que atormente, doa, ou até traga um ou outro sorriso. A gente tenta, mas lembra. E quando me pego, barba ruiva, sentado à beira do mar, há sete anos atrás, fumando um charuto, e bebendo uma Itaipava, tudo que pareceu ir embora, volta. Lembro exatamente de você ao meu lado, feito estivéssemos vivendo isso agora: pernas de índio, cabelos loiros ao vento, colar de contas, assobiando uma marchinha de Carnaval. Não tínhamos rotina, nem vontade. Acordávamos e logo estávamos sentados no mesmo lugar, acompanhando o movimento das ondas. Isso quando não dormíamos por lá mesmo, e despertávamos com a água molhando nossos pés. Passamos dias à fio e fome, vivendo de desejo e sol. Fazia calor, e não era pouco. Vivíamos grudentos e molhados, fosse mar, chuva, ou suor. Vivíamos grudados um no outro, cheirando à boêmia e descontrole. Não sabíamos o que mais acontecia, não queríamos saber. Éramos eu e você. Eu, você e o mundo. Mundo que sabíamos inventar e contornar tão bem. Seu colar de contas ainda está preso no fundo da mala que trouxe comigo. Acho que ficou bem por lá. Com sorte, ainda tem uns cristais de sal, um pouco de areia, e cheiro de mar. Você ainda é toda a minha saudade e tudo aquilo que sobrar dela. E me conforta relembrar dos pequenos detalhes. Como o dia em que você perdeu seu chinelo para o oceano, e saiu com uma alga presa entre os dedos. Ou a vez em que você resolveu fazer malabarismo para que ganhássemos algum dinheiro. Ou a constelação de sardas em volta do seu nariz. As únicas pessoas que ainda sei aonde estão, são as pessoas que perdi. E por isso ainda acredito que você não se foi para sempre. Pois até seu nome eu nunca mais ouvi. Mesmo que tenha sido por cautela alheia, e que, longe dos ouvidos, longe do coração. Se eles sabem, eu não sei, e é isso que agora me importa. Eu voltaria para te ter de novo em meus braços, enquanto você contasse estrelas, ou colocasse palavras e excrementos para fora. Na vida, não há nada que seja irreparável de tão triste. Mas os danos às vezes corroem, e a gente vai tomando formas até monstruosas. Hoje, posso dizer, que não sou o mesmo. O menino dos olhos doces, como você dizia, agora carrega gostos salinos e escorregadios. Mas isso faz parte do viver, e renascer, e construir, e derrubar, e até do amar. A gente se ajudou a crescer, e se transformar, mas a malemolência te cansou mais do que cansou à mim. Eu voltaria, só para te ver indo embora de novo. Eu voltaria.

domingo, 24 de outubro de 2010

Cartada.

Sim, eu sei que por aí chove, e que, na última semana, você tropeçou e caiu, e sentiu dor. O que doeu em mim. E sabe, por aqui tem ventado muito, acho que tem faltado um pouco desse concreto daí para segurar a ventania. Mas anda tudo jóia, digo assim, no caso de você se perguntar. Ontem saí para andar de bicicleta, irônico, mas acabei estatelado no chão. Na lama, mais especificamente. Fui desvendar a floresta aqui do lado, depois de alguns goles de vinho. Vez em quando, quando esbórnia, quando ebriedade, quando excesso, ainda acho que sou menino, que meus ossos continuam firmes e fortes, que ainda tenho muito para aguentar. Mas aí me estatelo e acordo, assim como era de se esperar. Não pude me despedir como recomendado pela etiqueta, e não sei se você percebeu, mas te deixei uma carta. Não tão detalhada como esta, mas carta. Cartas servem, pois têm licença para tudo. Licença poética, licença para dirigir - palavras -, para serem atiradas no lixo, ou queimadas. Espero que tenha lido antes de ter tomado qualquer atitude radical, o que seria bem a sua cara. Não que a sua cara seja displicente ou impulsiva. Sua cara, digo melhor, seu rosto, é a coisa mais bela que já vi. Falando em beleza, ontem fui passear por um vinhedo, e até fiz algumas anotações sobre uvas, flores e gostos, as quais queria compartilhar contigo. Mas quem sabe em uma próxima oportunidade. Enfim, falando, também, em impulsividade, queria que você soubesse que estive planejando essas minhas férias - ou sumiço - há tempos. Economizei para a passagem. Perceba o singular, foi uma ida, só não sei quanto à volta. Não se martirize por isso, peço, se ainda puder te pedir alguma coisa. Nada disso tem a ver contigo. Nem comigo, às vezes acho. Parece que algo me possui quando menos espero, e aí eu afundo. E são esses aqueles tempos em que me tranco em casa, costuro mentiras para estar preso, e digo sentir saudades. São esses aqueles tempos de crise, caos, contenção. Bem, do que estou falando, você os conhece bem. Não escrevi essa carta querendo te pedir desculpas. Porque desculpas são a promessa de que tudo há de mudar. Não sei se mudo. Não sei mudar. E quantas vezes você disse que me ensinaria. E quantas vezes você falou para eu pular, mesmo sem enxergar o fundo. Acho que existe algo de, no mínimo, santo em você. Nunca vi perdoar, nem querer, tanto. Por aí sei que foram dias de inquietação e indisposição. Por aqui tem doído muito. Tudo me dói. Quando eu falo tudo, você sabe, é porque é tudo mesmo. Ou porque eu sempre precisei exagerar para me convencer de que sentia algo. Mas nesse caso, é tudo mesmo. Dói saber que te deixei aí, sem nem dizer que partiria, sem nem dizer que iria voltar. Porque eu não sei, eu não sei. Dói saber que, daqui um pouco, você me perdoa, por isso e por tudo. Mas o que mais me dói, é saber que você ainda me ama. E saber que por mais que você tente, e eu tente, eu ainda sou toda a sua vida. Toda ela. Sem tirar, nem pôr. Sem tirar férias, nem pôr para lavar. Eu sei que estou longe, mas daqui mesmo te enrolo em meus braços. E cheiro seu pescoço. E te deixo de lado...
Vê se se cuida.
Que eu te cuido também...

É lis.

Não sei qual o seu problema com as palavras, que, em suas mãos, parecem sair mais facilmente do que pela boca. Seu sorriso é como um estupro, e violenta qualquer espécie de felicidade. Seus olhos são uma sobreposição de buracos, cada um mais negro que o outro. Mas ainda assim eu te amei, e te amaria de novo. Mas ainda assim eu te segurei nos braços, e te beijaria de novo. Mas ainda assim eu pulei, e afundaria de novo. E eu morro de saudades, e eu canto sua ausência. Mas ainda assim eu faria tudo de novo. Nem Deus sabe o quanto você me machucou. Deus sequer existe para poder saber, seria algo que você diria. Como era descrente, e desbocada, e desconexa, e deslocada, mas era minha. Era minha forma de achar que os dias não seriam dias e dias apenas, minha forma de achar que às seis horas, com o sol se pondo, de repente, tudo estaria bem. Minha forma de achar, e me perder. E te perder foi, indubtavelmente, a maior de todas as feridas. Que hoje cutuco com unhas e dentes, rolando de um lado para o outro na cama, procurando seu cheiro, ou algum fio de cabelo que pudesse ter restado. Rolando de um lado para o outro na cabeça, rememorando, remoendo, remando. Remando sem chegar a lugar algum, somente para movimentar os braços e facilitar a circulação de sangue. Não sei por onde você tem andado, nem com quem. Mas sei que, de mim, você ainda se lembra. Comprei seu livro de contos, eu estava no canto de alguns deles. Miúda, digitada antes das reticências. Foi doloroso me ver ali, exposta para todos que compadeciam de seu amargor. Mais doloroso, foi quando, relendo, lembrei que você me disse um dia, os maiores amores não merecem ser publicados. E, de repente, suas palavras, eram mesmo tudo que você tinha. E, de repente, eu fiquei com nada, pois foram todas elas, um vazio. Você falou tanto para mim de todos os enganos, os que vieram e os que estariam para vir. Falou tanto para que eu abrisse os olhos, que não me limitasse, que não me entregasse - ainda que fosse para você -, mesmo que eu não obedecesse, você falava. Eu escutava, maldição! eu escutava. Você me dizia que eu tinha sido um grande amor - ressaltava que eu não seria o único, nem o último -, dizia me amar assim tão grande que mal cabia nas palavras, porque elas não me mereciam. Os maiores amores não merecem ser públicados, você me dizia quando eu te perguntava o porquê de eu não ser citada em uma de suas colunas. Dizia que esses amores deveriam ficar escondidos, por debaixo da pele, do cobertor. Mas lá estava eu, e eu sei que era eu. Fazendo a janta escutando Elis. Remexia e picotava, Madalena, minha pequena, serena. De pôr-do-sol nos olhos, que eu mesmo dei. De coração grande, que eu um dia roubei. E eu reconhecia tais versos, que vinham nos cartões de Natal, nos cartões postais, sempre assinados com seu nome. Você mentiu, você me mentiu. E tudo que eu queria agora era te puxar pela gola e te atirar escada abaixo. Você mentiu, você me mentiu: eu não escutava Elis.

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Amélia.

Você era como eram as horas, previsíveis, mas ainda dotada de uma incerteza na medida exata. E era bem bonita, digo assim de passagem, enquanto passo pela Barra da Tijuca, desviando meus olhos da imensidão oceânica. E era até bem jeitosa, digo com todo o respeito, enquanto me relembro de suas pernas morenas, e lábios corados. Mas tinha também seus defeitos. Falava demais, e falava, e falava, e falava, e não se calava nunca. E às vezes parecia ser meio ruim das idéias, quando vinha me dizer que estava tudo errado e que iria se mudar para algum país da Ásia, em busca de paz espiritual, ou que iria desistir de tudo e sair rolando por algum dos morros da Serra do Mar. E não sei exatamente porque, no meio de tanta gente, fui logo te conhecer, e te levar para casa, e te levar para cama, e te levar para o altar. Mas aconteceu, e aí que então estou aqui. São muitos os anos que se passaram, dentre eles os anos dourados, os anos prateados, logo cinzas, e quando, por fim, oxidados, ficaram tão pretos que, se fecho os olhos, mal consigo os reconhecer. Eu devia ter ido por algum caminho esotérico antes de ter seguido por aquele entre os bancos da igreja, com todos de cabelos penteados e perfumes franceses. Talvez, assim, eu tivesse previsto como isso tudo nos faria enlouquecer. Não foi preciso muito tempo até que aumentasse o número de cigarros, garrafas de whisky, pancadas nas paredes e nas portas, em nossos rostos e corações. Nem mais muito tempo para que, enfim, você denominasse cada um dos meus defeitos, e logo depois apelidasse todos eles - e à mim - de: merda. Era quase o refrão de algum hino revolucionário, a merda da sua hipocrisia, a merda da sua indiferença, a merda da sua irresponsabilidade, a merda da sua merda, a merda do seu descaso, vá à merda, seu merda! E suas palavras pareciam até mágicas, porque, de repente, a merda se espalhava e batia no ventilador, e vinha para tudo quanto é lado. Aí eu, ou você, ou nós dois saímos de casa, e íamos procurar conforto em qualquer uma das coisas que ainda gostávamos de fazer. Como sentar e chorar com os amigos, falar palavrões, tomar um porre, tomar coragem, dizer não-volto-nunca-mais, e dormir com outro perfume, e se enganar com outro corpo, ou nem se enganar, só aceitar um corpo de verdade, sem apalpar as imperfeições, ou as anotar para depois jogar na cara. E não importava o quanto falávamos, ou comparávamos, batia a necessidade do jantar posto à mesa, das mãos dadas pegando sol pelo calçadão, das conchas do mar e do sono seguro, nós voltávamos. E sentávamos nós dois no apartamento que meu Deus do céu! como era branco e vazio, e sem calor, e sem barulhos, e sem graça, sendo tudo aquilo que um dia eu sei, eu sei, meu Deus, que evitei. E a malemolência de nossos dias sempre me levava para um passeio no passado, e era quando eu reabria alguns álbuns de fotos, relia algumas cartas, e você aparecia por detrás de mim, exigindo uma explicação com aquelas suas pupilas dilatadas, e vinha com por quê não foi com ela? por quê não ficou com ela?, como se tudo na vida fosse tão fácil como foi com você. E a sua exigência me irritava, e sua falta de rumo, de consciência, de alguma percepção qualquer que não fosse daquilo que estava na ponta de seu nariz. E na sorte da reciprocidade, já não nos queríamos mais. Pegou suas roupas, fez uma mala, destrancou a porta, e me disse que não era mulher de voltar atrás. Hesitou, esperando que alguma coisa eu falasse. Demorei. Demorou. Abriu a porta, e saiu. Saiu da minha boca tais palavras: é, Amélia é que era mulher de verdade...

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Retornar.

Você se deita ao meu lado, enquanto eu finjo estar dormindo por horas. Você me espera de pé no aeroporto, enquanto eu finjo estar esperando por aquele momento há dias. A gente se abraça, se beija, se desnuda, se tranca, e transa. E as tranças do seu cabelo fazem barulho no travesseiro, e a minha falta de cabelo te pede por carinho. E a gente se abraça para afastar os pesadelos, e é quando eu suo frio, e acordo sedento por um copo de água. E na manhã seguinte, estou de partida. E chego em algum lugar que, de longe, parece lugar nenhum. E me deparo com uma língua diferente, com várias, na verdade. Que, no começo, parecem intrusas ao tocarem a minha sem trocarem palavras. E saio, com um total eclipse of the heart alheio tocando ao fundo do poço em que o enfiei. E pego o primeiro bondê que passa, de número oitenta e três, setenta e seis, quem sabe. E da janela manchada consigo ver a lua, e o cais que, um dia, deve ter sido o porto de alguém. E aproveito para tirar uma foto, e apagar segundos depois, quando penso que não deveria dividir contigo a magia dessa felicidade imunda, desfocada pelo vidro embaçado de chuva. É, justamente quando chove. Quando chove parece que tudo inunda. A rua lá fora, o buraco aqui dentro. Quando chove mal se vê o cais, mal eu tenho um porto. E então eu chego em algum lugar que, na verdade, é lugar nenhum. E me sento na beirada da calçada. E acendo um cigarro molhado, sem saber se foi a chuva, ou meus olhos. E começo a rabiscar em um papel, palavras tristes, meio doloridas por terem sido estranguladas. É que sabe eu não te mereço e você não merece isso mas eu sinto sua falta mas você que eu senti já não existe e passam das quatro horas eu sem saber que horas são aí porque saí do fuso e já não funciono. Cafeína adianta, nicotina nem tanto. Os goles de vinho tinto branco rosé verde ou sei lá se aquilo era vinho mesmo. E que me deixava em um estado de inércia agora eu estou atolado na lama do meu sapato. Os sonhos aqui se nublam pesadelos a nicotina aqui não ajuda contrai o tempo aqui não passa se arrasta e já não sei se bebi demais se fodi de menos se era seu corpo ou o meu se meu corpo um dia foi seu. E fecho o caderno, perco a tampa da caneta, um tanto de vida. E assisto o dia amanhecer. E apareço todo imundo no hotel, e a bela moça me oferece uma toalha. E, de brinde, a levo comigo. E lá vem o banho, e com a água que primeiro cai nela, me sinto bento. E a sensação passa, me sinto bastardo. E continuo a caminhar meio que caindo para um lado, sem saber se é escoliose ou culpa. E continuo a me arrastar por corredores e camas, até que um dia a esbórnia acaba. E eu entro no avião, e congelo com o ar-condicionado, e tento acender um cigarro no banheiro, mas algo de repente me impede. E lá vem a aeromoça. E sei lá o que acontece depois. Só sei que chego com a garganta inchada, e o zíper da calça aberto. E lá está você de pé, jogando fora o calendário no qual contou os dias. E me abraça apertado. E vamos para casa. E, de repente, meu ombro pesa ainda mais para o lado. Não sei se é sua mão miúda me puxando para ver umas flores ou a culpa. E acontecem todos os episódios de tira não tira eu tiro você também, e eu finjo que adormeço, e você finge que não sabe, e se deita, e me abraça. E seis anos depois, você de frente para o parapeito, depois do décimo quinto andar, olha em meus olhos lacrimejando e nada diz além de: às vezes a vida dá um medo, né?

terça-feira, 19 de outubro de 2010

Milano.

E descer para fumar um cigarro de cabelo molhado no frio europeu de congelar. Dar uma olhada de rabo de olho na cidade da moda. E pensar que, está na moda isso de almas siamesas que se descobrem subitamente. E de repente, esperando que isso aconteça ao descer para fumar um cigarro de cabelo molhado no frio europeu de congelar. Dando uma olhada de rabo de olho na cidade da moda. Pensando que está na moda isso de almas siamesas que se descobrem subitamente. E, vai ver, de repente, isso até aconteça. E pensar na felicidade, aquela dos filmes e livros de amor. Uma felicidade-suspensa. Felicidade aquela de ficar nas pontas dos pés, erguer os braços, e ainda assim não alcançar. E ter aquela vontade de abraçar o mundo, ou quem me trouxe a ele. E tendo descido para fumar um cigarro de cabelo molhado no frio europeu de congelar, reparar nas luzes da cidade da moda. E pensar que no fundo de algum oceano, ou por detrás dos vidros de algum aquário, algumas formas de vida bioluminescentes - andei estudando -, produzem sua própria luz e a carregam ao redor de seus corpos. E tendo pensado nisso, pensar também que não carrego luz alguma. E tendo acabado o cigarro que desci para fumar de cabelo molhado no frio europeu de congelar, não receber sequer notícias da minha alma siamesa que deve estar vagando por aí.