segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Liberté.

Eu quero que você siga em frente. Como se não fosse tão difícil. E não precisa olhar para trás. Alguém ainda vai aparecer. Mesmo que eu não queira. Algo não nos quis juntos. Mesmo nós ainda querendo. Algo nos afastou. Então não é de se assustar que, de repente, alguém apareça. Bem na sua frente, e logo depois, ao seu lado. Nas fotos que você pendurará nas paredes da sala. E exibirá para seus filhos, e netos. Alguém que saiba ser o que você precisa. Que eu nunca soube. Então foi tudo um engano, um equívoco. E nós não fomos o que pensamos. Porque não cabíamos. E haviam os outros. Muitos além de nós mesmos. E houveram os encantos, os esbarrões. Então não era de se assustar que, de repente, alguém acontecesse. Eu não mais escrevo, não consigo escrever. É como se não me restassem lágrimas. Como se eu nunca tivesse sabido como chorar. Por aqui, tudo indolor, incolor. Foi assim sua partida. Depois de já ter partido. Eu me olhei, e estava sofrendo. Eu me virei de costas, olhei de novo, e você não estava mais marcada em mim. Eu não pude mais sofrer, nem mais um pouco. Eu não estava preparado, mas aconteceu. Eu não te vi indo embora de mim. Mas sei que, antes, doeu tanto. Doeu sem fim. Pareceu até que eu rumava à morte. Tudo tão trágico, e desesperador. Em nenhum lugar eu cabia sem você encaixada em mim. Não sabiam me consolar. Eu não queria consolo. Eu só queria você de volta. Eu quem fui embora. Quando estive cansado. Desisti de lutar por você, por nós. E passei a lutar comigo mesmo. Foi duro, grosseiro. Estive desorientado, mesmo estando no mesmo lugar. Eu esperava que você voltasse. Eu esperei, por muitas noites, sentado na poltrona próxima a porta, fumando meus cigarros. Eu tinha te prometido que iria parar. Mas eu queria que, mesmo assim, você me aceitasse. Porque assim saberíamos o que havíamos achado saber por tanto tempo: que éramos, éramos um do outro. Você nunca voltou. Muito pelo contrário, foi para ainda mais longe. Não restaram nem sombras, nem uma sombra sequer. Eu te escrevo agora, depois de ter parado por muito tempo. Porque eu queria me lembrar. Queria reconstruir tudo, até encontrar o segundo exato em que você fez as malas e partiu de mim. Se partiu em mim, em micromoléculas de amor e saudade, que foram expelidas pelos meus poros, muito depois de serem expulsas por minhas lágrimas, muito depois de você ter se tornado ausente. Sei do dia em que te conheci, ainda que eu misture com muitos outros rostos. Teria sido um dia como qualquer outro, mas não foi. Você apareceu na minha frente e, logo depois, ao meu lado. Nas fotos que nós penduramos nas paredes da sala. E exibiríamos para nossos filhos, e netos. Um dia, todo o nosso castelo-sonho de futuro se desmoronou. Não quero voltar a falar nisso. Apagaria a lembrança de felicidade que restou. Um dia, você se foi. E ficamos nisso, por enquanto. Enquanto ainda éramos dois seres existindo juntos, era bonito. Funcionava bem, eu sendo inquieto, você sendo brisa. Nós sendo o perfeito incompleto. Sendo juntos, e tudo ficando bem. Você não tinha nada de magnífico, só quando estava em mim. Porque me dava uma calma que não era de minha natureza. Era impossível não gostar de você. Não olhar para você e querer ser seu. Ainda mais quando você olhava com aqueles olhos que não eram de ninguém, mas que precisavam ser. E eu os quis. Foi como aprender a andar de bicicleta. Levou um tempo, foi mudando um pouco a forma, a gente foi tirando as rodinhas, e o negócio foi ficando mais emocionante, mais arriscado, suscetível a quedas. Pareceu, inclusive, a parte em que a gente nunca esquece como pedalar, porque eu tinha a certeza de que nunca me esqueceria de como era ser com você. As certezas se perdem com o tempo. É o que acho, agora. Não sei mais como era. Não sei mais como seria agora. Não consigo pensar. Ao mesmo tempo que quero. Você se foi, é a última coisa da qual me lembro. Sem ter uma visão clara da situação. Você se foi e eu não pude, sequer, insistir mais uma vez para que voltasse. E eu não sofri. Não poderia, porque não percebi. Estava imerso, em algo que eu talvez não saiba o quê. E quando fui sentir sua falta, ela já não estava mais lá. Foi embora junto com você. Em uma tarde quente de verão. Ou não. Em mais uma noite de profunda solidão. Na qual eu percebi que não me sentia mais só, mas sim, liberto. Ainda penso em você, como uma memória turva, uma imagem prestes a ser apagada. Ainda penso em você, como pensarei por vários anos. Como algo que foi embora sem que eu pudesse perceber. Pensarei um pensamento que perdurará por toda a eternidade. Eternidade esta que acabará um dia. Um dia, quando eu me for, você se for, quando nós formos. Ficará uma saudade, que será guardada em segredo. Porque ninguém soube quando você se foi, muito menos eu. Eu ainda te sinto aqui, como um corpo que esquentou a cama, e se pôs a dormir entre outros braços. Eu ainda te sinto aqui como falta. Aquilo que foi, e não voltará mais. Aquilo que foi, e foi apenas. Porque não sobraram formas de definir a perda, nem muito menos a partida. Eu não mais te amo, mas ficou um carinho. Só peço que o deixe comigo. É tudo que me resta de nós.

domingo, 30 de janeiro de 2011

Que Saudade.

Cabelos cor de fogo. Chama, me chamando, com o risco de queimar, pegar fogo. Se um dia todo dia fosse como um dia qualquer, talvez eu confessasse todos os meus segredos. Os poucos que tenho, que guardam neles muitos outros. Que vão se emendando feito uma teia. Aquela que sustenta a vida. Não vamos falar dela. Um dia eu nasci. Em um outro você também. E estamos no mesmo cenário - que nem de longe é bonito. Mas estamos em um lugar, que por enquanto ainda é o mesmo. Eu depositaria em você toda a minha loucura. Mas está cedo. E ainda faz sol. Mais tarde, talvez veremos chover. E eu seguro, em uma mão, um cigarro. E em outra, uma das suas. A outra, sua também, vai escapolindo, para outros lados. Que eu não enxergo, porque não quero ver, nem saber, nem escutar. Porque tem sido bonito. E seria bom manter assim. Bonito e distante, nada arisco. Ou arriscado. E de nada eu sei. E dizem, melhor assim. No sossego dos beijos desesperados. Mas do coração calmo. Porque não é de ninguém. Já foi, mas aí é passado. E como presente, passou. E eu deveria te contar. Mas é melhor assim, sendo somente silêncio. Eu e você, alguns suspiros. Mas tudo calmo. Porque não há pressa. Então não se apresse, não estou indo embora. Nem você, eu espero. Desesperado, desesperançoso, esperando. É o que temos para hoje. E o resto dos dias. Uma espera constante, desgastante. Mas sabemos, ainda há resquícios. Mas disfarçamos. E vemos os outros. Que não sabem quem somos. E nem nós mesmos sabemos. Ao som de um samba, com uma cerveja, na mesa de um bar. Estamos eu, você e uns outros. E mais, e tanto. Ainda é pouco. Aguentamos. Seguindo em frente. Eu e você. E é cedo, talvez não chova. Os dias têm sido quentes. A gente aguenta. Eu não te conheço. Você não me conhece. A gente se estranha - é isso que faz o novo. A gente se arranha - é preciso deixar marcas. A gente vai indo, com a maré. Aqui não tem mar. Mas a gente vai, daqui para algum lugar. Não sabemos onde, mas um dia encontramos. Estamos sentados, nos olhando, e não sabemos, e evitamos. Mas fingimos que serve, é o que temos. Poderia ser mais. Não sei se ambos queremos. Seu sorriso sorri aqui dentro. Você me lembra dela. Ela não me esquece. A gente vai levando. Eu sinto falta. Mas você faz bem. E bem é só bem. E nada mais. O que poderia ser, a gente vai vendo, sentindo, vivendo. Que saudade de ser amado.

terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Reminescente.

O que houve antes do término foi uma série de episódios envolvendo medo, crueldade, e incerteza. Eu sabia o que era certo. Você negava. Eu não sabia mais se era tão certo. Você tentava me convencer de que não. Se tratava de uma noite assombrosa, com poucos corpos navegando pelas avenidas, com poucas estrelas nos vigiando do céu. Uns amigos me esperavam na mesa de um bar, confiantes de que eu tomaria a melhor decisão. Tomei. Não tomamos, porque você não concordou. E foi dolorido, sentir suas lágrimas escorrendo pelo ombro que eu te ofereci. E, ainda mais, sentir as minhas escorrendo junto. E as nossas se tornando um choro só. Um canto sofrido, acompanhado do som dos pneus, e da televisão da casa de alguém. O que viria depois era o de se esperar, minha mão enxugando seu rosto. Meus olhos fingindo estarem secos. Meus passos fazendo barulho no gramado carente de chuva. Você ficando para trás. Eu me segurando para não te olhar. Porque, olhando, eu não teria coragem. Mesmo assim, olhei. Olhei e você precisava de mim. Que eu esperasse você ter forças. Eu não pude esperar. Para não salientar meu coração fraco. O que precedeu o término foi amargo. Pois eram recorrentes os pensamentos de que aquilo podia não ser o certo. De que fiz a escolha errada. De que você não soube me impedir. De que, vai ver, você não quisesse. De que fosse realmente seu desejo chegar ao fim. São coisas que eu nunca saberia. E nunca perguntaria. Porque melhor distantes, do que qualquer coisa. A angústia perdurou por muitos dias. Enquanto eu ficava sabendo dos seus sorrisos, e você, da minha fome. Meu coração estava vazio, e eu me alimentei da completude alheia. Uma hora, as coisas haviam de mudar, e foi quando eu percebi que não precisávamos mais um do outro. E enfim, esteve tudo bem. Não, não esteve. Porque eu não podia aceitar a idéia de você sendo outra. Com outros. E, especialmente, a idéia de você sendo feliz. Porque, no momento do término, sua tristeza foi tão profunda que eu poderia jurar que seria eterna. E cruelmente, eu quis que fosse. Que você vivesse de luto, por minha morte em você. Passado esse tempo de te desejar a infelicidade, você não era mais nada. E mesmo que eu quisesse me lembrar de tudo, tudo havia sumido. E eu caminhava por aí, com a certeza de, talvez, te encontrar caminhando também. Mas nossos caminhos se destoaram tanto que eu nunca mais te vi. E não sei mais dizer se você era loira, ou morena. Se era minha, ou se foi só acaso. Se tinha os lábios frutados, ou demasiadamente finos. Não sei nem dizer se te achavas bela. Carrego a certeza de que um dia eu te amei. Talvez em um campo de girassóis, ou no meio de uma guerra civil. Ou eu te amei sem ter cenário, porque nosso amor não foi merecedor de atos heróicos, ou foi inodoro, incolor, insosso. Não sei que amor foi nosso. Mas um dia ele foi. Foi embora. E o processo, embora lento, não foi dolorido. Não tanto quanto esperava. Foi como uma alma saindo de um corpo morto. Seu amor saindo de mim, foi assim. Eu não senti nada. Não estava lá para ver. Mas quem esteve em volta, sentiu. Sentiu as dores e a funebridade da partida. Você deve ter sentido também. Ao ter me procurado e visto que eu já não estava mais lá. Que eu havia me tornado, para você, apenas um corpo hemorrágico. Não sei por onde tem andado. Nunca procurei saber. Se te olhasse agora, talvez perdesse toda a magia do mistério. De não saber quem amei, se foi amor de verdade - posto que dizem que fim de amor é sofrido. Eu não saberia sequer te reconhecer, eu acho. É um jogo da mente para poupar o coração. Ou o coração nunca se ocupou muito contigo. O que importa é saber se está bem. Coisa que eu não sei. Então, talvez, não seja mais tão importante assim. Eu estou bem, caso queira saber. Vi nos olhos de uma mulher, um caminho, uma rua, um mar, um mundo. Estou desvendando o lugar. Depois que me emancipei de você, tive momentos de desacreditar em tudo. O que eu realmente precisava era que acreditassem em mim, e você não foi capaz! Hoje vivo com a certeza de que as escolhas foram certas, e eu não voltaria atrás para corrigir nada. Nada, nem meus piores erros. Se eu voltasse, e fizesse tudo como esperado, talvez eu não fosse capaz de te esquecer de novo. Então está tudo bom como está, e a vida vai indo como tem que ir, e eu não sinto sua falta. Eu nunca senti nada.

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

C'est La Vie.

Estamos com tanta raiva, que nunca mais nos olharemos olho no olho. Nunca mais face à face. Nunca mais boca à boca. Nunca mais nos salvaremos. Nos deixaremos morrer. Como morrem as flores, ao decorrer das estações. Seremos cruéis, unha por unha. Olho por olho. Porque tudo que fomos antes, uma hora se transformou. E não faz muito tempo. Então ainda ardemos, ferozes, querendo sangue. Visto que tudo endureceu. E se endureceu tanto, não há mais solução. Solução nenhuma se não nos trocarmos por lapsos de violência e agressividade. Já fomos muito felizes. Em um tempo no qual nossos defeitos ainda eram charmosos, e nossos problemas ainda eram contornáveis. Quando sabíamos perdoar. Quando fingíamos saber, pelo medo de perder. Tanta coisa ficou guardada, tantas palavra que prefirimos não falar. A explosão não foi conjunta, foi individual. Porque as mágoas minhas eram minhas. E os rancores seus eram seus. E nós não sabíamos o que o outro sentia. E já sentíamos coisa demais para saber. No começo, tudo fluiu ao som das mais belas canções. Com direito a flores, e beijos, muitos beijos. E tudo era completamente amor - ao menos caminhávamos para isso. E foi. Foi só amor. Foi amor e desejo. Foi amor e desejo e paixão. Foi amor e desejo e paixão e ciúme. Foi virando uma coisa negativa. Um amor embalado aos sons do desgosto. Dançávamos no ritmo das músicas. Outras vezes, no nosso próprio ritmo. Deixamos levar. Eu sendo levado por outras. Você sendo levada pelo tempo. Houve uma desritmia na forma como concordamos amar. Sem limites. Nem para o amor, nem para nós. Eu ainda lembro do dia em te vi pela primeira vez. Por acaso, você apareceu perante meus olhos. Que olhavam em busca de outros. Mas acabou por serem os seus. Os seus que me acompanharam crescer por anos, que repousaram sobre os meus, que me acalmaram, que me enlouqueceram. Não dávamos certo, era o que diziam. Desde o começo, desde a primeira troca de saliva. E não escutamos. O que hoje, é reconhecido como um erro. E, na época, como um desafio. Que não conseguimos enfrentar, não até o final. Pois hoje estamos separados, vivendo outras aventuras - para não confessar que estamos estagnados na memória de quando éramos dois, e dois somente. Ninguém teve culpa, só nós mesmos. Que deixamos outros entrarem, nos deixando escapar. No simples espaço que separam os dedos - mesmo juntos -, espaço em que sempre cabe mais um. Não há forma fixa para um par de mãos dadas. E ainda que houvesse, são muito tentadores os riscos. O risco que era ela, o risco que era uma outra, o risco que eram todas. Todas pelas quais eu te troquei, ainda que por uma noite só. Para completar minha solitude. Minha existência tão só, que não dependia só de você. Que, na verdade, não dependia sequer delas. Era uma dependência minha em mim. Mas fazia bem sentir o calor de outro corpo. Mais bem ainda, me sentir em outro corpo. Ainda mais em tempos em que você se esquecia do meu. Quando você não via nada mais de belo, nem de terno, nem de seu. Perdemos a ternura, e por isso, perdemos o amor. Ou nunca sequer o tivemos, e foi tudo um engano. E nós dois caímos. Hoje, eu tenho raiva. E sei que você também. Não pelo que passou. Mas pelo que está passando agora: nós. Nós estamos passando um para o outro. E não há nada que possamos fazer. Já tentamos de tudo para nos manter juntos. E agora estamos passando. Como se nada nunca tivesse acontecido. E você está com alguém. E eu também. Mas não parece certo. Não parece porque essa idéia me inquieta. Não que eu não esteja feliz, não que de vez em quando eu não seja convidada para jantar, não que os braços que me confortam não sejam o suficiente. É só que eu e você, eu e você éramos nós. Apesar de tudo, acima de tudo, éramos, e sabíamos como ser. Sabíamos tão bem. Eu me apaixonei por outra. Despretenciosamente, sem achar ter uma chance. Tudo muito sossegado, no tempo certo. Ainda somos eu e ela, sem nos excluirmos em uma palavra. Estamos quase lá. Mas a idéia me assusta. Eu já estava tão acostumado a nós, e levamos tanto para sermos, que tenho medo do caminho. Eu sei que estamos com raiva, e que, por agora, ela talvez seja nossa melhor companhia. Devemos mesmo nos manter afastados. E somente nos presentear com faíscas. Mas existem muitas coisas que eu deveria te dizer. Não são essas que eu te disse agora. Elas virão depois. Depois, quando tudo já estiver curado. E eu puder te olhar nos olhos sem querer te matar. Às vezes penso que melhor morto, se não seu.

sábado, 22 de janeiro de 2011

Que Dia?

Os berros de uma criança, o incansável latido de um cachorro, os pneus cortando as poças d'água,
Hoje fará sol a maior parte do dia, com chance de pancadas de chuva no fim de tarde em algumas áreas da cidade.

Acordei, rosto inchado, costas doloridas. Sala, e casa, vazia. Mais um dia.
Mais um dia, e o que haverá de especial?

Andei até o banheiro, dando de cara com o espelho, nele o rosto deformado, resultante de um sono, há tanto, acumulado.
E a casa vazia.

O coração vazio. O gosto do esquecimento, do abandono. O frescor da calma. Da falta de alma. Que deixa passar o vento.
O vento.

Que invade pelas janelas, e levanta os papéis na mesa, e os carrega para longe.
A distância.

Não te enxergo de onde estou. Mas sei que aí você está. Pensando em mim, no que aconteceu comigo, no monstro que você acredita que me tornei.
As figuras disformes.

Sombras no escuro das cortinas. Assustadoras. Sombras da solidão.
Foi.

Foi escolha minha. Ter deitado com outro homem. Ter desistido de você, de mim, de tudo.
A consequência.

Um dia eu acordei e já não éramos mais os mesmos. Não existia mais na gente aquele desejo de fazer companhia, carinho, amor. Deixamos que tudo se esgotasse, e não restou mais nada. Mais ninguém para contar nossa história. Não restou uma história. Foi apagada, transferida para outros corpos. Nós, que um dia amamos tanto, viramos nós, que um dia se soltaram. E fomos embora. Você e seu ciúme doentio. Eu e minha sede de mundo. Uma hora já não nos saciávamos mais. Insistimos. Porque é isso que fazem os verdadeiros amores. Lutam, inclusive a pau e pedra, quando acabam os instrumentos de destruição em massa. Não digo que, hoje, sinto sua falta. Não a mesma falta que senti quando te percebi ir embora. Quando isso aconteceu, ainda dormíamos e acordávamos juntos. Mas não estávamos mais lá. Os pensamentos, os desejos, as tentações, tudo nos levava para longe. Nos transportava para outro lugar. Na qual novos braços esperavam abertos. Foi triste e, também, doloroso. Porque apostamos tanto naquilo. Nos achando maiores e especiais. Porque ninguém entendia nosso amor - nem nós mesmos. Se é que aquilo foi amor. Às vezes penso que foi carência, uma dependência, um vício. Era difícil estar perto, mas tão mais difícil estar longe. Lembro das tantas vezes em que nos dispersamos e juramos que iríamos seguir nossos próprios caminhos, sozinhos. Tentativas inúteis de nos afastar. Sempre voltávamos, sendo os portos mais seguros. Fazíamos amor, para apartar as discussões sem fim. Para disfarçar o cheiro de outros, a falta de sintonia nos beijos. Você voltava acostumado a mim, eu voltava acostumada a outro. E era um recomeço. Outra vez, outra chance. Mas não disfarçávamos as mágoas. Porque um dia você me abandonou, e eu te abandonei em resposta. Eu pisei nos seus calos, em todos eles, porque um dia você se esqueceu do meu. Eu te culpava por tudo. Como ainda devo te culpar, mas tento não pensar nisso. Já não posso te guardar com carinho, então te guardo como um pensamento vago, abstrato, distante. Não posso te guardar com carinho ou estarei resgatando tudo. Aquele amor que não deu certo porque não cabia em nós. Porque não cabia a nós dois amar aquele amor imenso que extrapolava os limites da sanidade e do perdão. Perdemos o controle. O tal amor tomou dimensões monstruosas, e vivia na tênue linha que o separava do ódio e da violência. Era grande demais para dois corpos miúdos. Que se agonizavam em posição fetal. Um amor com falência completa de órgãos. Que nos matava mais do que nos deixava vivos. Que deveria ter perdurado por toda a eternidada, mas nós não soubemos dosar. Uma overdose de amor. Tendo como resultado dois corpos separados e mortos. Épico, heróico, morremos juntos de nosso próprio amor. E você seguiu adiante. E eu também. Com meus mortos, pelos meus caminhos tortos. Ou não. Você ainda espera que eu volte. Sendo outra. Eu não te espero mais. Cansei de te esperar. Resolvi pisar fundo na realidade, e você com os dois pés no freio, para ter a certeza de que não se moveria um milímetro sequer. Porque um dia eu poderia voltar, e você ter mudado de lugar, e então nós dois não estaríamos lá. Então estaria sim tudo perdido. Mas tudo se perdeu tão antes. Bem no começo. E o resto foi só persistência. Porque era tão bonito, então não haviam motivos suficientes para o fim. Um erro. O que veio depois foi sempre muito feio, só disfarçava. Eu disfarçando com minhas palavras, e você com seu sorriso santo e compreensivo. Foi tudo uma mentira. Mas nós dois acreditávamos, porque existia o amor. Só não a estabilidade daquilo que o segura. Não tínhamos forças, o que era, às vezes, até bonito. Ver o nosso esforço para fazer daquilo alguma coisa grande, única. Sabíamos, tínhamos ciência, de nossa capacidade - que era pouca perante aquilo tudo. E mesmo assim tentávamos, tentávamos, tentávamos. Mas acabou. Acabou, assim. Em uma palavra só. Eu diria fim. Mas é melhor começo, porque nos dá esperança. De que um dia, um dia, haverá algo de especial.
Que dia é hoje?

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Nome da Saudade.

Se eu pudesse dar outro nome pra saudade, sem que fosse nome de flor - mesmo que esta tenha cheiro de uma -, ou nome de estrela - mesmo que esta brilhe mais que qualquer outra. Se eu pudesse dar outro nome para a saudade, eu daria nome de mulher. Um nome que eu não revelo agora, porque seria como abrir minha vida inteira para as metades que me lêem. E eu não vivo de metades, ninguém vive. Nem de leituras, é preciso cavar mais fundo. Naufrágio. É disso que eu preciso, de alguém que naufrague, de alguém que se afunde, comigo. Porque a realidade é grotesca. E de nada adiantam os enganos. De nada adianta se enganar com uma moça bonitinha que exiba um sorriso de lado. De nada adiantariam as moças, nem mesmo as moças! À noite, quem cobre é o escuro. Não há nenhum calor ou odor corporal. Só uma superfície macia para ser tateada pela cegueira da noite. Não te vejo há muito tempo, e é esse tempo que mata. Que dilacera. Que é cortado e estrangulado pela saudade. Tentei me enganar com uma moça sorridente, e bela. Tentei, como tentei. Mas eu menti. Não havia um traço de sorriso sequer. Era apática, indiferente. Poderia jurar que estava morta. Mas não, não estava. Pois um dia eu a vi sorrir com outro. Isso mesmo antes de termos nos acabado. Nós nos acabamos sem nem mesmo termos durado. Foi breve, nada intenso, nada marcante, nada inesquecível. Passou, supersônica. Se me doeu? Bem mais do que deveria, como uma rasteira. E eu bati com a cabeça no chão. Estava tentando me enganar, tentando te esquecer. Eu tinha me esquecido de como se encantar é bom. A gente sempre se esquece das melhores coisas da vida. Eu quase me esqueci de você. Quando vi esse fim trágico, eu estava sendo a maior piada. Dei de cara comigo mesmo. Um talentoso criador de fantasias. Estive tão ocupado tentando viver. Viver para poder anotar cada traço, gravar cada imagem, e enfim colocá-los aqui. Somente para ter algo para narrar, contar, acusar. Se sofri foi por escolha. Por solidão. É deveras triste depender do sofrimento para viver. Pior ainda, é admitir tal vazio. É esse vazio que carrego. Feito um fardo, que veio desde a infância. Desde aquele momento distante em que meu avô me pôs de frente à máquina de escrever e me pediu para inventar uma história. Ali, eu contei a história de um cachorro que viveu sozinho até não aguentar mais, e se jogar na frente de um carro, na Avenida Paulista, com os faróis já acesos, na hora rush. Eu nunca contei minha história. A do rapaz por detrás dos óculos de hastes pretas, do sorriso alinhado, e com o charme tentador dos perdidos. É muito fácil cair nos meus enganos, nas minhas palavras e nos meus romances. Tão agridoces e misteriosos. Não há mistério. Está tudo escrito. Todos os acentos e acenos. Principalmente os adeus. Tudo que foi embora, principalmente o que ficou. Pois revelo agora que não houve drama, nem lágrimas, nem flores ou amores para anteceder. Se trata de uma bela atuação. Na qual eu sou autor, causa, consequência e personagem, de todas as histórias. Todas medidas com antecipação, para haver o devido preparo, a tamanha cautela com a qual eu calculo qualquer gesto. Não existem impulsos. E as paixões não foram violentas, nem degradantes. Todas eram mulheres, devastadas pelo meu egoísta desejo de torná-las musas. Musas de um pintor sem tela, de um músico sem ritmo. Pediram-me sinceridade e eu a entrego enfeitada. Em letra cursiva, com minha assinatura ao final. E um beijo doce e longíquo. E também, indiferente. Aqui estou eu, fumando um cigarro, completamente despido. Não há luz do luar invadindo as frestas da cortina, nem uma mulher nua na cama. Só tenho comigo uma ressaca desumana e uma reflexão à respeito da vida. Que eu nunca vivi, satisfeito em desenhar cenários de perdas e encontros. Eu sou o homem dos encontros. Extremamente desencontrado e que, nem homem mais é. Pois perdeu toda a virilidade e todo o encanto da pele macia e das palavras ousadas. Eu falava da saudade quando resolvi falar de mim. Pois é dela que eu vivo, me alimento, me aqueço. Saudade daquilo que não foi pelo simples fato: eu não quis. Pois saudade para mim tem nome, de flor, de estrela, de amor - o verdadeiro e não o rabiscado aqui -, tem nome de mulher. Porque ela seria, para mim, tudo isso em uma coisa só. Um ser pequeno, quase minúsculo. De cabelos quase longos. E sorrisos quase duros. De outra cidade. Talvez de outro mundo. Um ser real, de carne, osso e de mim. Às vezes eu me pego pensando que talvez ela não exista. Que ela seja mais uma das projeções da minha imaginação que surgem na cabeça e descem até a ponta da caneta. Talvez ela seja alguma coisa entre tudo isso que eu escrevi aqui. E talvez eu esteja sofrendo de tantos males que me peguei apaixonado por uma das minhas personagens. E ela seria a mais bela e mais humana de todas elas. No fundo, eu sei que ela existe. Quase em outro continente, mas existe. Numa ilha de dimensões mínimas. Cercada por oceanos e outros. Muitos outros. Menos pecaminosos que eu. Que não tentam se enganar por pequenas moças de saias rodadas, com cheiro de frutas e de ervas. Que não se alucinam com qualquer troca de olhares que poderá se tornar fruto de uma obra prima. Minha saudade tem o mesmo nome que ela, e origem, e endereço. Minha saudade é toda ela. E ela é toda minha. Ou quase.

Jasmim.

Acordei e segui como seguem os mortais. E quis te escrever pois, há tempo, não te escrevo. Eu tentei recordar do seu rosto, mas só me restaram as sombras e alguns contornos. E a cor de seus cabelos. Sua cor de fogo. Acordei atrasado, como de costume. Só tomei um café, um resquício de café que havia restado da semana passada. Quando eu ainda tinha alguém para me servir de quitutes e amores. Apalpei a cama, coberta por morros de edredons, em busca de algum corpo que eu pudesse ter esquecido por lá. Não havia corpo algum. Conquistei, com a pressa, uma dor de cabeça de deixar tonto. E por muito tempo eu ainda caminhei exalando o cheiro de ressaca. O sol estava aos berros do lado de fora de meu apartamento. E de repente, eu percebi que havia escolhido o traje errado. Da última vez que nos falamos, eu estava vivendo com uma mulher mais velha, e você queria combinar uma ida ao cinema. Eu não pude, e senti muito. Porque não inventei uma desculpa esfarrapada, muito pelo contrário, eu fui o mais sincero que pude. Você ou ela, simples assim. Foi a escolha que ela me impôs. E você, retrato em preto e branco do passado, ainda que fosse capaz de me puxar sem levantar um dedo sequer, já era uma intrusa conhecida por meus anticorpos. E ela era o novo, com alguns fios de cabelo grisalhos, mas o novo. A aventura com ela durou, mais do que a minha com você. Não foram muitos os anos, mas foram muitos os momentos. Lembro-me dela com mais clareza, não pela pouca distância de tempo. Mas porque foi céu aberto, sem pancadas de chuva - ou pancadas de outra natureza. Você sempre foi o inesperado. O meu inesperado. Minha bonequinha russa que se abria e tomava diferentes formas e tamanhos. Eu peguei o carro e dirigi até o trabalho. Da maneira mais simples que poderia ser. Eu não tenho que te contar dos detalhes, como o pneu furado e as barras da calça sujas de lama. Também não tenho que te contar que cheguei no escritório e a primeira coisa que abri foi o zíper da saia de uma mulher. Na verdade, eu não tenho que te contar nada. Mas te escrevo, porque você é meu único segredo. Eu nunca te contei para ninguém. Você dizia que fazia bem, afastar os olhares invejosos. E eu sei que todos nos invejariam. Porque tudo parecia uma maravilha. E foi maravilhoso. Na hora do almoço eu parti sozinho. Acho que eu queria que sentissem pena de mim. Pois lá estava eu, calado, enquanto todos conversavam e gesticulavam em demasia. Lembrei-me dela, a que não você. De uma tarde que passamos no parque. Não lembro o que fizemos, mas foi algo compatível ao nada. E foi um dos nossos melhores momentos. E eu consigo lembrar exatamente do rosto dela. Que brilhava mais com a luz do sol. Dos olhos dela, que ficavam menores a cada vez que diminuía a sombra. Eu quis que vocês se conhecessem. Mas ela tinha medo. Ela tinha medo porque achava que você exercia sobre mim um poder inagualável. E, até hoje, eu não sei se ela estava realmente certa. Um poder ou um encanto. Qualquer coisa assim, diferente. Ela morria de ciúmes toda vez que eu citava seu nome. Vinha me dizer que meus olhos tomavam um brilho único, e que meu corpo parecia mais resistente. Ela sempre soube que eu te amei de verdade. Coisa que eu só deixei que você soubesse tempos depois de ter partido. Quando eu, mesmo sem fôlego, corri atrás de você. Persegui sua sombra. É de um espanto enorme saber que faz tanto tempo. E que se nos cruzássemos na rua, as chances de reconhecimento seriam mínimas. Eu voltei para o trabalho, e mesmo não movendo um milímetro, eu me sentia tão cansado. Mas o dia estava bonito. Dava para ver da janela uns mil gramados. Todos bem verdes. Tem chovido por aqui. Pelo menos uma vez ao dia. E a água cai com tamanha vontade que não dá para se esconder dela. Eu preciso te contar, conheci uma mulher que me lembra muito de você. Mas uma versão mais esclarecida. Mas juro, a voz é a mesma. E também o sorriso. Eu enlouqueci de amores por ela, no primeiro minuto. E pensei em largar tudo. Era minha segunda chance de te ter. Nunca me senti tão egoísta. Ela não era você. E apesar da semelhança, eu não tinha motivos o suficiente para dar meu amor a ela. Amá-la por ser quem ela não era. Saímos umas vezes depois. E eu descobri, por detrás de um semblante que eu jurava ser seu, um amor só dela. Mas era um amor platônico. Que não tinha futuro, nada além dos minutos que passássemos juntos, e as juras que sussurrássemos através do telefone. Ela vivia com outro homem. No qual eu não vi nada de muito especial. Ela me enlouqueceu, me adoeceu. Vivemos um romance secreto. Que não durou muito, porque, para ela, não era nada tão grande. Era só um adultério, um crime com armas vermelhas - a cor da paixão, não do sangue. Ainda nos encontramos, de vez em quando. Para partilharmos nosso suor. E para que eu possa sofrer mais um pouco. Visto que é a única maneira de manter nós dois vivos no meu coração. Eu penso nela com frequência, como penso na outra, e em você. Eu já tive muitas mulheres nessa vida. Muitas que hoje são só uma vaga lembrança. Eu tenho um apreço doentio pela perda, pelo sofrimento. Você foi apenas a primeira a reparar nisso. A vivenciar minha loucura. Minha sede de conquistas. Minha coleção de abandonos. Eu amadureci muito. Percebi quando fui tomar um café, no meio do expediente e me peguei, pela primeira vez, não invejando os homens que reconquistaram todas vocês. Eu tive meus dias de sorte. Minhas pétalas de ouro. Meus tão enormes amores que puderam correr soltos. Eu sinto saudades. De uma forma inocente. Santificada. Eu as tornei inalcançáveis, distantes, mágicas, para sanar minha procura de motivos para não tê-las mais. Nunca mais. Nenhuma. Voltei para casa, em meio a despedida do sol. Misturei um café com um maço de cigarros. Café que eu mesmo fiz, se tornou imprescindível e urgente aprender a me virar sozinho. Darei conta, eu acho. Logo, logo, irei dormir. Estou meio embriagado. Começo a me preocupar, o café não deu muito certo, faltou água. Troquei por uma garrafa antiga de whisky. Uma que você mesma me deu. Eu nunca havia tido coragem para abrir, até hoje. Eu precisava te escrever porque sinto falta de conversar contigo. Por enquanto, digo ser só isso. Você não precisa de mais de mim. Você sequer precisa de mim. Enquanto eu, eu te encontro nos lugares mais improváveis, como nos botões das flores de jasmim, nos olhos de outra amada.

Inconsistência.

A melodia começa lenta. E algumas batidas mais fortes vão entrando pelos ouvidos. Tentamos não concentrar em cada fragmento da música, pois não entendemos os acordes. E como dois seres dissonantes e discordantes, destoamos. Destoamos do quadro no qual estamos pintados. Duas figuras caricatas. No ofício de dois amantes. Que não mais se amam, mas ainda se embolam e se enrolam no chiar do disco. Nos agudos das vozes cantantes. E no grave, no gravíssimo tom, do viver. Porque estamos setenciados um ao outro. Feito pagássemos pena de prisão perpétua. Pelo crime que cometemos ao estendermos aos mãos e nos entregarmos. Não faz muito tempo desde que te conheci. E vice-versa. Ao avesso, sabemos muito bem quem somos. Ainda nos perdemos na confusão das mutações corriqueiras do cotidiano. Na qual um de nós sai de casa bem-humorado, e volta sedento por desgosto. Nós passamos a nos desgostar tanto com o passar das horas. Porque o tempo que sobra, falta para cuidarmos de nós. E se tornam cada vez mais mal-feitas as declarações, as transas, as barbas. E enquanto fumamos o último cigarro do dia, prolongamos a noite para devastar cada mais o que restou. O que antes era um campo verde e florido, e que agora é uma área de risco, prestes a um soterramento. Temos tanta coisa para derrubar, desmanchar, desabar. Desabamos em lágrimas, porque os gritos ecoam e fogem. E nada cura. Já que não há nada para ser curado. São pequenas frestas de dor, que marcam nossos rostos iluminados, pela luz do poste que atravessa a janela. Nas noites escuras em que nem uma alma viva sequer caminha pela rua. Que nem uma alma sequer se aproxima do estado de transe que atingimos. Ficamos vermelhos, à ponto de explodir, à ponto de ebulição, à ponto de violência, mas nos contemos. Nos contemos porque eu não ousaria colocar minha mão no seu rosto a não ser que fosse para um carinho. Não ousaria passar minha mão em seu contorno a não ser que fosse para tatear nosso amor. Ele, que deve ainda estar escondido por aí. Em algum espaço entre as suas curvas. Em algum espaço de tempo que se perdeu. Porque ninguém acreditaria se disséssemos que acabou assim. Que ninguém viu quando, nem como, mas que sumiu. Feito um fantasma. Um amor invisível e fugitivo. Com a habilidade de um samurai. E ninguém acreditaria se ouvisse quando eu te digo que penso em outras. Que penso em outra. Uma em especial. Que ficou no passado, antes de você. Você que foi a maior de todas. Ela, que me deixou com a sede de mais. Mesmo que amores não se misturem. Amores não se misturam. Mesmo qualquer coisa. Eu tenho pensado nela, talvez pelo desgaste em nós. Talvez porque ela fosse menos abalo sísmico, como você é. Talvez porque ela me apresentasse um colo quente e a certeza de mesa posta, independente do cheiro que eu carregasse na gola da minha camisa. Você me confunde demais, você é por demais intensa e inesperada. E, até, desesperada. Esse seu desespero para encontrar respostas. Coisa que nunca fiz questão. Pois tudo começou como uma aventura, pois você era a mais bela e inconsequente, e tínhamos tudo para viver a boêmia juntos de mão dadas. E de repente você virou uma neurótica, quase psicótica, com tendências homicidas. E eu fui enlouquecendo junto com sua loucura. E eu tenho pensado mesmo nela. Que me ligou na semana passada, para elogiar a crítica que escrevi para um jornal. Para dizer que eu pareço muito mais amadurecido, e que ela adoraria me encontrar qualquer hora dessas para dividir uma garrafa de cerveja. Mal sabe ela que eu regredi na minha maturidade e hoje sou um menininho assustado. Porque não sabia que uma mulher só poderia tomar forma de tantas outras, hora doces, hora maquiavélicas. Uma mulher que não gosta de cerveja, e que resiste, resiste mesmo, ainda que uma provinha só fosse me fazer mais feliz. Ou menos indigesto em ter que seguir, em ter que seguir uma linha que não me avisaram que viria. Você tem pensado em outros também. Por ser um vuracão avassalador que rouba todos os olhares que saem pelas ruas. Que te seguem. Você dita as rotas, e todos seguem. E eu não sei como logo eu te consegui. Vai ver só eu te aguentei. Porque parece tão calma e, ao mesmo tempo, tão forte. E mesmo que intimide, isso atrai. E mesmo que atraia, também repele. Porque ninguém se julga capaz de carregar a responsabilidade de ser seu. O preço é muito mais alto do que o estipulado. Estou pensando nela, e você está pensando em outros. Eu pensando na que perdi para te ter. E você pensando nos que está perdendo para estar comigo. E nós dois pensando até onde isso vale à pena. Eu tenho lido muitos livros de auto-ajuda, parecendo cada vez mais incapaz de andar com meus próprios pés. A maior chance que a vida tem de vingar se concentra na aceitação de que é possível viver sozinho. Você sabia disso? Nem eu. Eu cheguei à essa conclusão por pensamentos próprios. A gente pensa que é indispensável apoiar a vida na de outra pessoa para seguirmos vivendo. Mas não é isso, não é nada disso. É preciso entender que estamos sós, apesar de qualquer companhia. Porque é a única certeza que temos: de termos sempre a si mesmos. Não levando em conta os acessos de loucura no qual não sabemos mais quem somos e não sabemos para onde fomos. Eu sei, agora, que eu preciso me aceitar como sou: sozinho. E que, também, preciso de um amor azul, para que seja sereno. Eu sempre soube que seria muito fácil te amar, pois você era o mais amável dos seres. Mais que os coelhinhos e os recém-nascidos. Você era dona de um encanto de desencontrar qualquer um. Mas a vida nos surpreende das maneiras mais violentas e obscuras. Eu não te procurava quando te encontrei. Aliás, eu não procurava por nada, estava me dando por satisfeito vivendo em uma panela morna com uma mulher que poderia muito bem ser a mãe de todos os meus filhos - isso se um dia eu resolvesse os ter. Mas acasos por acasos e estantes desorganizadas, você esteve ali. Bem na minha frente, em um momento em que, se eu mesmo pudesse, não estaria. E ali se deu o encontro que resultou nessa história de amor caótica que vivemos. Um romance que perdeu toda a feição apaixonada e histérica. Os suspiros e os gemidos. Um romance que preferiu seguir por linhas trêmulas escritas por um autor que não se sabe se sofre de Parkinson ou de Alzheimer. Porque foram tantos os detalhes esquecidos. Visto que o esquecimento, dado certo momento, pareceu a mais sábia de todas as escolhas. Porque era dolorido nos rever passando na televisão. Nos escrever com todos os acentos, e travessões, e travessuras. Travessos, isso que éramos. Como dois moleques se aventurando na mata ciliar de um rio, seguindo até uma cachoeira, até o alto dela, e pulando. Pulando como se não houvesse amanhã, com uma inconsequência majestosa. Pelo puro sabor da beleza já não tão pura assim. Porque havia o passado, e dele, ainda restavam os resquícios. E nunca nos perguntamos até que ponto aqueles resquícios, aquelas pequenas cinzas, estavam acesas para queimarmos um ao outro. Nunca nos perguntamos nada, por preferir o silêncio a qualquer crise de ciúme. Eu fumo meu cigarro com a sensatez de um homem transparente, incolor. Chegada certa idade, e certo nível de sufocamento, já não temos motivos para esconder mais nada. E eu, que me escondi por detrás da sua loucura e de seus espasmos, agora me sinto livre para te dizer. Dizer que te amei percorrendo todos os traços de sua loucura, que sempre me foi clara e sincera, até chegar na parte mais frágil de ti. E te amo, ainda mais, agora. Certo de que um dia nos reencontraremos. Não para sermos enfim feitos um para o outro. Mas para sermos mais fortes e não nos arrastarmos com uma brisa qualquer que levante um pedaço de roupa qualquer. Para sermos adultos o suficiente e conseguirmos nos olhar nos olhos dizendo limpo e claramente: eu aguento viver sozinho, e flutuar contigo.

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Cor-de-Sol.

O filme da nossa vida. Ele começa assim, com um narrador ao fundo, algum ator fingindo ser eu, e dizendo: o filme da nossa vida. E eu começo andando sozinho, pelas avenidas e ruelas de uma cidade qualquer - que não aquela. Porque para aquela cidade, eu não volto nunca mais. Cada traço no asfalto, cada pedra no chão, cada árvore - sobretudo as árvores -, me lembra você. E sua lembrança me fere - porque da sua ausência eu não me esqueço. Então estou eu, embriagado, na presença dos meus melhores amigos. Onipresente, para ser sincero. Pois estava em um daqueles momentos em que um homem foge de tudo - inclusive de si, incluindo o próprio corpo. Então está meu corpo embriagado caminhando com os amigos. Todos falando sobre as delícias da vida. E eu degustando o silêncio - que sabor amargo ele tem. Então estamos todos levando a vida - principalmente sobre os ombros. E eu caminho sentindo um peso enorme querendo me empurrar para o chão. Piso cada passo sem rumo. E vamos caminhando, por essa noite e por outras próximas. E em um dia eu te vejo passar pela porta do escritório. Seus cabelos dourados, mais do que dourados, reluzentes. Seus passos leves, tão leves que eu só consigo te imaginar vestida de branco. E eu acordo naquele momento, de um sono que eu não tinha conhecimento. Achava que aquilo ali era a vida mesmo. Mas não era. Então você passa e eu vejo as folhas despencarem da mesa, eu tremo na cadeira, e o mundo vira outro. O narrador diz não acreditar em amor à primeira vista. E eu diria o mesmo. Os dias passam, e a gente se reencontra. Seus olhos encontram os meus e aí sim temos o começo de tudo. Não me recordo dos detalhes. Não me recordo de muitas coisas. Mas eu lembro do seu sorriso presente pelos corredores - junto à sua risada doce. E eu te encaro, eu te encaro sem parar, por jurar que você era o que havia de mais belo em todas as faces de todas as terras de todos os mundos e universos: nada existia como você existiu. E ainda existe, mas isso fica para depois. Você me olha, e eu te olho. E ficamos entreolhares olhando cada detalhe sem nos aproximarmos. Porque eu era um grande babaca. E você era a realeza. E eu andando com umas pessoas insignificantes. E você parada, porque tudo ia até você. Você tinha um poder de sugar tudo. De uma forma prazerosa, não destruidora. Eu não consigo me lembrar do que veio depois dos nossos primeiros olhares. Então passemos por essa parte - até porque passar muito tempo tentanto lembrar me dá uma angústia desumana. Um dia meu celular toca, e eu te escuto do outro lado da linha. E eu reconheço sua voz. A voz que eu nunca ouvi, mas que anseei por duros invernos, por todos os infernos que vivi. E você me chama para sair, mas eu não posso. Não posso porque muitos dependem de mim. E você não acredita, porque eu sou um ser tão magro e tão desfeito. E por umas horas ficamos nisso. Mas eu tento resgatar seu convite e eu tento resgatar aquela mínima chance que você me apresentou: a chance de me fazer feliz. Mas as horas passam, e um ou dois dias também. E então nos reencontramos. Desta vez eu sei o seu nome e sei a sua voz. Mas não me aproximo. Por me sentir tão pequeno, eu não consigo ainda te ter por perto. Mas você insiste, e eu sem saber o que você viu em mim. E acho mesmo que não viu nada. E foi esse nada que te deu vontade de fazer alguma coisa. Seguem os epsiódios de desconcerto e uma oportunidade de viagem. Nós dois conversando em segredo, e eu te conto. E milhares de falas fofas e pedidos. E eu arrumo minha mala, apenas uma semana, talvez duas, estou indo atrás do meu futuro. E você aparece minutos antes do avião partir. E nos escondemos em um corredor escuro. E nossos olhos se encaram. E nossos lábios se beijam. E meu corpo todo treme em cima do seu. E ali eu me apaixono perdidamente, e conto para todo mundo. E todo mundo fica tão feliz, porque você era tão impossível para mim, que não tinha nada de especial. E eu vou. E o tempo se arrasta - tudo em segredo. E eu retorno. E mais outro reencontro. Em segredo, perto das latas de lixo, onde você me beija e eu te desejo. Mas sinto medo. Porque você é tudo que seria demais para mim. Nos olhares curiosos vemos os outros pensando que nada em nós fazia sentido. E eu me sinto mal, quase acuado. Mas você me diz que tudo bem, e então fica tudo bem mesmo. E nós frequentamos lugares diferentes. Sempre desejando a presença do outro. E você vai começando a me amar, e eu já perdido de amores. Um dia, em lados opostos da cidade, bêbada, você me liga, e jura amores, e fala "amor", e fala que ama. E eu caio, meu Deus! naquele momento eu me despedaço! E não consigo acreditar, porque ninguém acreditaria se eu contasse. E tudo acontece tão rápido. E nós dois namorando, enamorados. E eu incrédulo. Depois, impiedoso. Porque não entendo sua embriaguez e sua necessidade de contato - ingênuo - com partes dos outros, e me jogo numa aventura passada. Retomo minha origem cretina e, até, maléfica. E, de repente, nas noites em que nos afastamos, começo a dormir em outros braços. E pensar que são outros amores. E pensar que você me engana. E pensar que eu não te mereço. E escutar tudo que me diziam, sobre suas viroses, sobre seus amantes, sobres seus amores e, especialmente, sobre sua falta de amores por mim. E eu acredito naquilo tudo. E me afasto, vou para tão longe que chega ser difícil que você conquiste um alcance. Mas você consegue, de vez em quando. E me puxa, e eu acredito em tudo que você me diz. E é inacreditável, porque nada no mundo poderia ser tão perfeito como era você, como era te ter. E você era minha, e eu era completamente seu. Mas um dia eu me escondi tão bem, que você desistiu de me procurar. E me ligou, às duas horas da madrugada, e me disse que não dava mais, que já estava cansada, que sabia de tudo. E você não sabia de nada. E eu quis pular, mas não tinha altura. E eu quis morrer, mas também não tinha mais vida. E ali tudo acabou. Tudo acabou e nosso filme termina em tragédia. Porque eu pulo do precipício que existe em mim e começo a ingerir, inalar, de tudo. Absolutamente tudo. Eu passo a viver de vento e tristeza. E vejo que a vida sem você não tem sentido. E chega o fim de ano, e você não chega mais perto. E eu nem te vejo mais. E a gente se afasta, e tudo volta ao normal, menos eu. E a gente se reencontra - desta vez sem sermos efusivos ou apaixonados. E a gente se evita. Você me evita, e eu demoro a perceber que preciso de você. E quando percebo resolvo correr atrás, e escrevo poemas, e mando flores, e te puxo pelo braço, e te ligo, e marco encontros, e escrevo um livro. Um livro que vira filme, este mesmo do qual te falo. Eu te perco para sempre. E estou para sempre perdido. E quando menos espero, você está com o outro. Um outro tão mais são e bonito. E eu tenho a certeza de que ele pode te cuidar direito. Mas eu não consigo engolir nem um gole da sua felicidade. E não é inveja, é porque eu só te aceito se for comigo. E eu encontro novas paixões, e novas mulheres. E são todas tão desequilibradas. E você sabe de tudo. E você me olha como se eu tivesse te abandonado, e eu tento te resgatar, mas você não quer, você não deixa. E eu te deixo ir embora, finalmente. Minto, não deixo. Não consigo. Passam os anos, e os novos amores. Vai tudo passando, acho que até eu mesmo passei com isso. Eu vejo suas fotos, e seu sorriso nunca foi tão grande. Não digo que nunca mais fui feliz, pois eu fui. Eu sou. Tenho tudo que queria, menos você. Que deve ter sido a parte mais importante da minha vida, acima de qualquer outra. Tanto que todos os meus outros amores competiam para ver quem chegava mais próximo de você. Mas nenhum deles, nenhuma delas. Ninguém, ninguém foi capaz. O filme da nossa vida se passa assim. Eu passando a vida inteira me arrependendo por, um dia, ter perdido você.

Encolha.

Dá para fugir. Ainda dá. A porta está destrancada, e ainda não estamos sentados tempo suficiente para nos sentirmos indispostos. Eu olho em seus olhos e, de repente, você me escapa. E eu diria que isso é medo, se não fosse falta de vontade. E eu diria que aceito, se não estivesse disposto a te arrastar comigo. Junto comigo pelos tempos que estão a vir. Mas você tem outro, com o qual divide a vida, há tanto, tanto tempo. E eu tenho outras, com as quais divido os corpos, por pouco, pouco tempo. E eu te vejo falar. E eu te vejo cantar. E eu te vejo dedilhar as cordas de um violão antigo. Eu acendo a luz, mesmo entrando sol. E acendo um cigarro, mesmo não estando só. E seu vento voa contra seus cabelos. E seus cabelos voam contra o vento. E você rege as rotas do universo. Com sua voz de algodão doce. E eu quero me esconder no seu sorriso. Mas eu não posso. Nós não podemos. Não nessa vida que estamos vivendo. E você me beija com vontade. E eu quero te falar da minha vontade de largarmos tudo. Para irmos para algum outro lugar. No qual não hajam outros, nem tempo. Porque em duas horas você tem que voltar para sua cama, e beijar seus outros lábios, e até dizer que os ama. E eu vou ficar sozinho. Porque Deus me quis assim. Porque se não for você, não será ninguém. Ou até será. Mas agora é você. E mais uma vez, a gente não pode. Porque nosso amor é feito de pequenos momentos. Que não vingam, nem crescem. Amor que só mostrou as caras agora, quando um beijo foi roubado. E nós não sabemos quem foi a vítima e quem foi o ladrão. Porque aconteceu de ser mútua a vontade - como deveria ser a minha de largar tudo. Nosso amor mostrou as caras em um mundo inexistente. Um mundo que nós criamos. Para um amor que seguramos. Eu te esperei por tanto tempo, mas agora você vive algo que não me pertence. Pertencendo a alguém. Que eu mal conheço, mas que juro ser tão melhor. E juro poder te dar muito mais, porque eu sonho esses meus sonhos de poeta. E vivo essa minha vida de artista. E tento escapar pelos buracos. Mas não estão neles a minha verdadeira saída. Eu só quero ser segurado de noite. Eu escrevo minhas palavras no ar, e elas ficam. Não me deixe ir embora. Porque eu não quero, e você também não. Eu não posso viver sofrendo por um amor que nunca foi meu. E espero que um dia você seja. Porque eu te coroei rainha do meu castelo de palavras, e a gente flutua nesse pequeno espaço de destino que nos colocou para longe. Levamos tanto tempo para nos encontrar, e Deus sabe o tanto que te procurei. Nos fundos dos copos, e no horizonte. Eu não posso olhar para você porque isso aumenta o meu querer tanto. Eu quero tanto te querer bem. Eu quero tanto que você se queira comigo.
- Escolha uma música, e eu toco.
- Escolha outro corpo, e eu morro.

sábado, 15 de janeiro de 2011

(Os parênteses).

(A confissão). Talvez eu escreva para você. Talvez você desperte alguma coisa lírica em mim. Talvez eu te torne objeto dos meus delírios. Talvez não. Talvez nada mude. Talvez continuemos os mesmos. Talvez eu continue vivendo de amores antigos. (Mas tudo pode mudar). E um dia eu posso acordar completamente seu. E você dormir completamente minha. E nós dois sendo um do outro. E nos sentindo completos. (Mas nada muda e permanece). E um dia acordaremos sendo de ninguém. E dormiremos sendo de outro alguém. E nós dois esquecendo um do outro. E nos sentido despertos. (O despertar). De rosto inchado, maquiagem borrada, bafo de uísque. De barba mal-feita, olhos cheios de remela, cheiro de cigarro. Nos despertaremos sim. (O motivo) Porque um dia você será de alguém. E no outro escapará de mim. Porque vivemos o que eu chamaria de disfarce. E eu disfarço minha culpa em você. Nós que já amamos tantos outros. Nós que não sabemos ser sós. E queremos ser nós para não sermos mais sozinhos. Mas solidão é questão de alma. E alma nenhuma se afaga. Nem se põe para dormir. (O sono). Os sonhos são todos tão belos, mesmo quando imcompreendidos. Sonhei contigo. Por toda a minha vida. Você é toda bela, fugindo da minha compreensão. (A mentira). Eu sempre escrevi para você. Porque sempre te esperei. E da forma mais corriqueira, e inesperada, você apareceu. E de repente era objeto direto dos meus delírios. (A alucinação). Suas pernas me fazem acreditar que você não existe. E seus lábios abrindo caminho para mim me fazem acreditar que nada mais existe. Nunca vi nada igual. Mas já havia te visto antes. Nunca te vi dessa forma. Nunca te vi mesmo te vendo. Nunca te enxerguei, mas agora te tenho. (A aceitação). Divido contigo meus cigarros, mas nunca meus desejos. Porque não somos os mesmos - não somos iguais e não somos os de antes. Se antes fomos, agora isso tudo eu perdi. Porque não te reconheço nas fotos antigas. Nunca fomos fotografados juntos. (O flagra). Você está com outro. Com outro e comigo. Estão juntos na cama. Diferente de nós, que estamos juntos no coração. Isso me machuca. Qualquer mínimo toque em ti me fere. Eu poderia te tocar de novo. (O passado) Seremos para sempre assim. (O presente). Fomos para nunca mais.

quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

Inexistir.

Você não pôde me odiar o suficiente para me amar. Você não pôde me amar. Porque não houve tempo. E se houvesse, teria arrumado qualquer outra desculpa. Porque estava com pressa e amor leva tempo, dá trabalho. Nessa parte eu discordo, o amor tem seu tempo sozinho. Podemos esperar com as mãos para o alto, dançando pelos campos, bebendo um vinho, dormindo abraçados. O amor percorre suas próprias linhas através de nossas curvas e nossas mãos. Mas você tinha pressa e não podia ficar. Nem por mais um instante. E nem deixar para depois. Você sabia que iria me amar. E isso te dava medo. Porque não foi amada antes, quando um dia quis. E você sabia que eu te amaria. Mas não sabia até quando. E isso te dava mais medo. Porque não poderia acabar antes que você saciasse todos os seus sonhos e desejos comigo. Antes que você já estivesse curada. Mas amor não é doença. Aliás, às vezes é, até, cura. Porque, quando amor dupla-face, que cola - mesmo que um dia, talvez, desgrude -, nos salva do maior mal do mundo: a solidão. Na cidade grande, e suas avenidas com nome de mulher, e suas estações de metrô, e sua garoa épica, o que mais mata é a solidão. Infecciosa, dividida nos goles de copos sujos nos lugares mais sujos com os seres mais sujos - e estranhos. Um dia desses dividi uma cerveja com uma prostituta. Uma das pessoas mais limpas que já conheci. Embriagada de sensatez, à procura do amor. Em busca. Desprendida das morais - até mesmo o amor foge das regras de bom convívio e costume. Naquele dia, eu ganhei o que havia perdido há anos: a esperança. Pois por detrás da íris dela, estava um mundo que só ela via. Só ela via porque só ela se permetia. O acreditar. Como é difícil acreditar, não é fácil se permitir voltar anos atrás e regredir aos sonhos infantis e inocentes. É preciso acreditar na inocência, para que ela retorne. Sem ela estamos sempre aflitos, estamos sempre apressados. Você amadureceu tanto, e endureceu tanto. E se proibiu à entrega. Ainda que eu não apresentasse perigo, até por ser tão mais sozinho, e por carecer tão mais de tanto mais amor e carinho. Eu te amaria, e você sabia. E eu sabia. Portanto, te amei. E ainda amo, achando que, assim, talvez você confie. Confie, pois não é todo dia que alguém insiste em cavar um buraco com as próprias mãos. Um buraco, pois estão dizendo que o mundo acabará em questão de centenas de dias. E eu quero te proteger disso. E se eu não puder fazer isso, quero, pelo menos, que você não assista. Porque é tão triste assistir o fim. Você não confia em ninguém. Mas eu sou alguém, alguém que te quer bem, e que te quer muito. Se o mundo acabará, suponho que tudo também se esvai. Mas o processo é tão longo e lento, que nós dois poderíamos ter valido à pena. Se não fosse esse seu medo. Se não fosse essa sua desconfiança. Se não fosse o fato de mal nos conhecermos - mas isso, perante a tudo, é tão pouco, e pequeno. Eu queria saber o seu nome, ter estado mais próximo do seu rosto, ter te conhecido antes de tudo que te aconteceu. Deus, estou sofrendo de amores que não existem.

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Entre Tesourinhas na mídia!

"Palavras desenhadas
“Que seja eterno até que cure.” A frase foi escolhida entre as muitas que a estudante de letras Julianna Motter, 18, escreve no blog www.comascartasnamesa.blogspot.com. Ela pediu aos seus leitores que elegessem as frases de que mais gostavam, para que pudesse transformá-las em arte. Na exposição, as palavras vão repousar em um painel com fotos.

“É uma fotocolagem de várias pessoas que conheço. Resolvi usar até uma foto antiga dos meus avós”, conta Julianna. “A outra frase que o pessoal escolheu foi ‘Segura aqui, amor, que um dia o amor acaba’. Nessa, não vai ter nenhuma foto. As letras é que vão formar o desenho”, emenda.

“O sebinho disponibilizou vários painéis de vidro, que nós vamos espalhar pelo lado de fora e dentro do café. Também tem uma sala, onde vamos pendurar alguns trabalhos”, explica Marina Lara, sobre o formato da mostra.

Além de fotografias, colagens e instalações, a exposição — que também conta com trabalhos de Adriane Oliveira, Carol Stieler, Francis Espíndola e Heron Prado, entre outros — vai ganhar um toque de música e poesia. “Na inauguração teremos alguns shows, como o da cantora Paola Lappicy, e leitura de poemas com Julianna Motter”, adianta Marina."

Resto da matéria: http://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/diversao-e-arte/2011/01/12/interna_diversao_arte,231946/mostra-traz-fotografias-instalacoes-e-quadros-de-11-artistas-iniciantes.shtml

segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

(Des)esperando.

Dezoito primaveras de idade. Com seus jardins floridos e sol macio. Eu vivendo meus trinta invernos. Poucos flocos de neve a caírem do céu, um chão branco de solidão, não de paz. Em um quarto escuro, com somente um abajour aceso, e a fumaça saindo de uma pequena brasa circular. Eu não consigo parar de pensar nela. E eu tento. Porque tenho coisas para fazer. Como reler livros ou me enganar com bons goles. Viver um engano, como se fosse uma escolha. Só uma redenção ou belo porra para me salvar de mim mesmo. Porque ela é só uma projeção da minha cabeça. Da minha cabeça direto no coração. Que dói, lentamente. Como se eu tivesse algo há tanto tempo e, subitamente, tivesse perdido. Eu nunca a tive. Como é possível sentir tê-la perdido? Nunca tive seu toque por mais de dois dias - somando todos os minutos. Nunca nem provei todos os gostos de sua pele. Ou tive aqueles olhos amendoados olhando só para mim. Ela sempre olhava para os lados. Não a culpo, o mundo é tão interessante. De repente, podia mesmo aparecer coisa melhor que eu. Claro que apareceria. Quem seria eu para impedir? Quem se não uma coleção de cacos? Ninguém quer para si algo que fere tanto. É arriscado. Pois que ela soubesse que um dia fui um vaso de flores. Muitas flores procuraram abrigo em mim. Algumas das mais belas e vistosas. Um dia, uma delas pesou demais e eu quebrei. Mas ainda existem os remendos. Existem, claro que sim. Eu não consigo me desvencilhar dela. E ela aparece, e eu sumo. Estou vivendo nisso de procurar a cura, e só encontrar mais veneno. De todas, talvez ela fosse a mais bela. Talvez não, talvez fosse alucinação. Ou meus olhos a enxergaram mais alto. Tão alto, ela parece uma estrela no céu. E tem nome de estrela - e estrela lá tem nome? Pose de estrela também, inalcançável com seus anos-luz de distância. Algo nela me puxa, me suga, me consome. Porque parece, agora, tão inacabado. Um encontro de duas línguas distintas, para formar palavras tão simples. Por debaixo de um céu, de um nada. E também não havia chão. Senão não teríamos caído. Eu caí. Porque ela alçou vôo e voltou para onde veio. Eu caí no velho truque de vamos nos apaixonar, mas um acaba se apaixonando sozinho. Não chamo de paixão. Talvez mais encantamento. Ou fissura, ou nada disso. Foi tão breve, mas queimou. E borbulhou. Não acreditava nisso. Ainda não acredito - o que torna tudo tão mais difícil. A gente se prende a umas coisas tão bobas - e um toque de mãos de repente pode parecer amor eterno. Nunca foi preciso amar ninguém. Porque é tão difícil ser realmente devoto de algo. E se prender. O sonho mais velho do qual me lembro é o de ter asas. Nunca tive. Mas vivo com essa sensação de estar solto no mundo. Não pertencer, não pertencer é o segredo. E voar, e flutuar, e fluir. Deixar fluir é uma saída. Não esperar nada, não esperar por ninguém. Há um tempo atrás, ouvi uma história de uma mulher que morreu esperando no saguão de um aeroporto. Sei lá se esperava por alguém, ou por um vôo. Mas esperava, eu sei que esperava porque morreu sozinha. Quem morre sozinho viveu na espera. Que nem ela. Ninguém quer morrer assim, mas ninguém pensa nessas coisas. É preciso ter cuidado. É tão perigoso se entregar a si mesmo. Porque nós somos feitos de tantos labirintos. E eles dependem tanto de outros. Bom é fugir. De tudo, absolutamente tudo. Para não acabar acabado. Para não acabar, não deixar nem chegar no meio. Só o começo já é satisfatório. Mas com ela foi diferente, e eu esperei - como ainda espero, mas não quero confessar assim tão rápido. Algo nela. Algo nela ou em mim, porque eu causei essa perda. Essa perda de sentido e interesse. E a elevei. Ela está acima de qualquer coisa que eu possa controlar. Entreguei tudo, pus as cartas na mesa. Com as cartas na mesa, concreto, com tudo em jogo, eu estou sentado com o tabuleiro sozinho. Ela é justamente a pessoa pela qual eu tanto não-esperei. E por isso somos aquilo desesperado. Desesperançoso. Porque eu não posso tê-la. Nem sabê-la. Porque mal a conheço. Só me lembro de seus lábios fazendo mais belos os meus. E de querê-la bem, e querê-la perto. Eu fantasio algumas coisas absurdas, mas isso não é esperar. Eu sei que vou morrer sozinho. Mas, às vezes, espero encontrar alguém...

sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

Declaro.

"When there's nothing left to burn, you have to set yourself on fire".


Imerso em pensamentos que não me levariam à lugar algum - não que eu quisesse ser levado também. Na tênue linha em que a introspecção se torna entrada para os questionamentos mais banais. Na parte do cérebro em que os neurônios estouram fazendo festa na mente. O coração só tem um caminho, escalando a coluna até chegar no lugar em que mais pode ferir: o pensamento. São muitos os anos que me separam de você. Muitas, também, as milhas. São muitas as coisas que nos separam um do outro. Porque, afinal, somos dois seres exatamente opostos. O que nos escreveu nas linhas mais tortas possíveis. Nas linhas mais desviadas e inconsistentes. Comprei um maço de cigarros novo, e um galão de vinho. Procuro uma válvula de escape, uma distração. Não sei se você tem assistido aos telejornais, mas o mundo está todo tão triste. Tanta coisa acontece, e eu achando que a minha dor é a maior de todas elas. Só porque alguém me rasgou por dentro. Com minha autorização. Porque é preciso um piscar exato de olhos para se ter o direito de entrar. Ou um não-piscar. Um simples olho-no-olho e de repente estamos atados. E por mais que tentemos impedir, ou evitar, o destino é quem manda. Veja eu, quarenta e três mil anos de idade, acreditando, finalmente, no destino. Cegamente também. Precisei me entregar para encontrar as razões. As razões que nos levam a isso. Essa desesperança por ter apenas, apenas, apenas, um coração partido. Coração partido, que coisa de poeta de mesa de bar. Pois não sou poeta. Nunca aspirei ser um. Mas o amor nos torna mais sensíveis que todas as partes do corpo humano - incluindo aquelas que secretam os mais úmidos desejos. Falando em umidade, por aqui tem chovido tanto. Dá até uma tristeza, porque parece que o céu nunca mais se abrirá. E sou tão egocentrado que penso, às vezes, até que a culpa seja minha. Porque eu tenho chorado tanto, mas de um tanto, que é bem possível que eu mesmo tenha instigado isso. Tudo bem, não sou capaz de uma coisa dessas. Mas bem que eu queria. Atualmente, eu quero de tudo. Pode me dar que eu recebo, no maior gosto. Tenho tentado entender - e aceitar - isso de viver sozinho. Porque é difícil, e nenhuma outra palavra define. É difícil ir dormir e acordar com a mesma sensação: a amarga incompletude. Falo de alma, não de corpo. É muito fácil encontrar corpos por aí. Na forma em que quiser, insinuantes e inteiros. É muito simples ser um corpo inteiro. Ainda que seja desejoso o encaixe de um outro para tampar os buracos. Somos todos muito esburacados. Um asfalto maciço, falho, ensopado de chuva, lama, secreções, segredos, inseguros. Somos completamente inseguros, um chão desnivelado, escorregadio. No qual é preciso coragem para pisar, e se firmar. Você está, agora, tão longe. Doloroso aceitar qualquer tipo de separação. Mas ainda, repartir. Repartir, partir, separar. Não dá para se desligar de certas coisas. Hoje, por exemplo, ao me olhar no espelho te vi chegar por trás e coçar minha nuca. E não está quente, nem desértico. Mas presencio um tempo de alucinações e muito suor. Suo frio, me contraio com arrepios. A falta é bem o imaginar. E com a imaginação se machucar. Sobe do coração tudo isso que pode enlouquecer um homem. Um homem como eu, tão esclarecido. Sempre muito claro sobre tudo. Sobretudo, sou escuro numa claridade quase transparente. Na qual sempre pôde ver todos os meus defeitos e falhas de caráter. De você, nunca escondi nada. Nem os meus lados mais monstruosos. Não te espantei por isso, eu acho. Não te espantei, para bem da verdade. Te expurguei, feito fosse um demônio, um espírito, que me possuísse o tempo todo. Você me possuía. Por escolha minha, talvez. Ou novamente o destino. Você possuía tudo de mim, desde os confrontos até os sentimentos mais belos e ternos, e toda a insensatez - você possuía meu amor e suas diversas faces e formas. Mesmo deformado, você aceitava. Mas aquilo me fazia um mal, porque era preciso sempre te amar - de outra forma eu não me julgaria digno de estar vivo - que, quando vi o tempo passar, nenhum tempo além do nosso existia. Declarar-se apaixonado é um martírio, uma sofreguidão infinita. Uma vertigem, uma cólica, um desconforto estomacal e sentimental. Um desconforto existencial. É pesado isso de depender sua existência na existência do outro. Pesado, tempos de dureza de carne. E malemolência de outras partes. Quando está tudo lindo, ninguém aceita. Porque belo mesmo é tudo aquilo que é feio e assustador. A beleza vem da depressão, do suicídio, dos homicídios, das facas que afiamos toda noite para matar nossos sonhos. O mundo é tão cruel. Exige um sangue tão frio se manter nele. Vou acender um cigarro e tragar sobriamente para enfim poder te dizer. Dizer tudo aquilo que guardamos achando que valerá mais ao ser enterrado junto a nós. Aquelas palavras que nos cruxificam e nos entregam como realmente somos: delicados. Você sabe de tudo que eu nunca pude te dizer. Porque sou muito orgulhoso. Ou isso não é questão de orgulho, mas sim de entrega. Entrega completa. Você pôde me levar comigo, seja na lembrança ou na chatice de te ligar todas as vezes em que estive fora de mim - ou seja, todos os dias, e noites, e madrugadas, e momentos em que eu não sabia que momento do dia eu estava vivendo. Eu preciso engolir o mundo para me sentir satisfeito. Mas você me satisfez das formas mais carinhosas - e até das mais violentas. Você me bastou como bastaria bastar apenas. Sem mais delongas ou explicações filosóficas. Está na polpa de tudo, tudo isso que eu quero te dizer e enrolo, mas não digo. Nunca estive pronto para uma entrega assim, então agora te entrego a verdade. De todas as minhas vidas, você foi a que mais amei. Porque era completo. Mas existia uma dependência doentia. Uma dependência da minha existência na sua. Na qual você era tudo. Você era tudo e se algo mais aparecesse, seria você também. Tudo aquilo que realmente vale, porque de nada valem as transas, os transes, o êxtase do toque e do desejo, os pensamentos calados e os sentimentos surdos. Você foi o que havia de melhor - e ainda há de ser. Porque, ainda que por mim - tão medíocre e desnecessário -, você foi - e continuará sendo - o ser mais amado que já existiu. Em todas as faces da terra. E em todo o corpo do mundo. De todo o mundo. Em todos os corpos, eu ainda te amarei.

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Roupas Passadas.

Às duas horas da madrugada, quando o silêncio invadir a janela entreaberta, você permanecerá comigo. Não me entrego às desculpas, muito menos às explicações. Não existem motivos para tudo nesta vida. Não precisam existir. Esta é uma carta de admissão, na qual eu admito que entre em mim a sua ausência. E que permaneça, permaneça até que seja conveniente dispensá-la. Por enquanto não existem dedos que se entrelacem aos meus, ou bocas que tampem o meu silêncio. Não há o que caber. Sim, é sobre o vazio que te falo. Mas um vazio confortável, no qual afogo minha inconstância. Se você foi, foi porque eu quis. Se eu fiquei, foi por não ter escolha. Não ter motivos. Não tenho motivos para te esquecer. Porque esquecer é deixar para trás. E eu quero você sempre à minha frente. E num simples trago, resgato lembranças pouco nítidas, e cinzentas. Porque a memória vive no preto e branco. Estou vivendo de memórias. Nada triste, bom mesmo é ter o que lembrar. Que a solidão me deixe forte. São poucos os pedidos que tenho a fazer. É pouco tempo perdido. Esse tempo que a gente conta a passagem em batidas - do próprio coração. Que, calmamente, incha e desincha. Porque não há pressa. Não há, não há. Que tudo tome o tempo que tudo há de tomar. O tempo toma tudo. Num golpe preciso de samurai. Corta e recorta, enquanto nada mais sobrevive. O tempo perdura. Eu perdôo sua ausência, como consequência da minha loucura. A qual joguei para você. Jogar tudo para o alto, jogar para o santo, jogar apenas, como consideremos essas soluções. Não dávamos mais conta, dizíamos sempre que não, mas sempre insistíamos em tentar outra vez. Outra e outra e outra e outra, porque estávamos cansados, restando somente um quarto de fôlego, dizíamos outra vez. As falas eram curtas, tais quais as respirações. Ao contrário dos suspiros, que eram muitos e prolongados. Porque desejo a gente nunca perdeu. Aquela coisa de pele, que arde apenas em imaginar. Aquela coisa de carne, de toque, que não some, que não muda - nem nunca mudará. Feito uma sina, na qual passamos noites sonhando - que hoje são mais pesadelos, porque sonhos ficam para os amores de bem -, e acordando na cama molhada de suor e saudade. O cheiro permanecerá pelos travesseiros. Ou não. Talvez preso na entrada das narinas. Um cheiro que não se esquece. Que nunca se esquecerá. Porque é inevitável querer dentro quem a gente quer perto. Seguindo à diante, perdendo a sobriedade com a qual traço essas miúdas letras, penso que é difícil esquecer. É como uma tortura, em que sabemos a resposta procurada, mas não entregamos. E que enfiem nossas cabeças na privada! Que dêem descarga! E choques-elétricos. É difícil perder a quem se ama. Contudo, é tão doce se amargurar com a saudade. Não tenho muito a te dizer. Porque nunca te disse muito. Sou madrugada na qual o silêncio mora. E às duas da manhã eu acordo. Somente para te dizer o quanto esse amor é forte. E o quanto me faz fraco saber de sua ausência.

quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

Meu Bem Querer.

Meu bem, te achei! te achei! te achei! Exclamando, repetitiva. Mal sabia que, por entre todas as partes do mundo que não faziam parte do meu, procurei. Por entre todas as estantes de todas as livrarias - e bibliotecas. Cavando todos os buracos dos jardins e escavando descobertas milenares, andando por aí à esmo, procurei. À espera, estando à espera. Fazendo da vida uma enorme sala em que eu aguardaria, ansiosa, com uma música instrumental ao fundo e um aquário cheio de lodo muito mal projetado e iluminado. Sala na qual as luzes piscam, possibilitando uma visão um pouco turva e uma provável enxaqueca daquelas. Te achei e era todo meu, completamente meu. E se eu não tivesse te encontrado, provavelmente em tempos depois estaria completamente sem rumo. Porque, sem mim, a vida nada mais era do que uma série de episódios tragicômicos, seguindo a simplória sequência do de-mal-à-pior. Você conseguia tirar uma risada daquilo tudo, é claro. Porque quando a vida é uma desgraça, e apenas uma desgraça mesmo, é claro que encontramos uma graça que, no fundo, bem no fundo mesmo, só existe para não nos congelar o rosto naquela feição de puta-que-pariu-fodeu-de-novo. Afinal, é impossível para qualquer um manter, para sempre, a boca entreaberta e os olhos contraídos, e estar, para sempre, preparado para expelir...expelir, que palavra engraçada. Expurgar, expurgar também. Enfim, não existem formas de estar sempre produzindo lágrimas, nem de estar sempre procurando soluções. Você não precisou procurar, esta parte ficou comigo. Você só foi levando na ponta dos pés, cuidadoso sobre os cacos de vidro. À despeito do que acham, é realmente no fim do poço que você encontra sua saída. Você, sendo todo meu, se nunca soubesse disso, provavelmente não aguentaria mais nem dez anos e desistiria da vida na primeira oportunidade, pulando de cabeça da ponte, ou se jogando nos trilhos de um trem de metrô que estivesse a anunciar a aparição em poucos instantes. Meu Deus! meu bem, que bom que te achei. Porque se eu nunca tivesse te achado, seu corpo nunca mais seria resgatado - por sorte, ou ironia, ainda te encontrei com vida. Imagine só, não te velariam, chorariam, enterrariam. Que bom que eu cheguei à tempo. Meu bem, não haveria mais ninguém que aparasse suas pontas, que coçasse suas costas, que te amasse infinitamente, ou que acendesse seu cigarro quando estivesse sem fogo, como eu. Neste mundo, nesta vida, não, não haveria. E não se pergunte o porquê. Porque não saberei te dar motivos. E não peça para mudar agora, porque temos um trato. Um trato com sei lá quem, talvez com o diabo, porque, às vezes, você consegue ser, para mim, insuportável. E tudo bem esse seu jeito imundo de levar a vida pelas mãos junto com uma lata de cerveja e um cigarro sem filtro. E tudo bem se você quiser levar também, comigo e contigo, umas outras que apanhe pelo caminho. Porque não importam os belos cortes das roupas delas, ou os sorrisos poupados do amarelar da nicotina, esmaltados por uma branquidão libidinosa - junto às suas pernas, especialmente coxas. Nenhuma delas teria com você, nem metade do que eu tenho. Elas, ao contrário de mim, não conseguiriam te manter vivo. Porque é preciso muito mais do que orgasmos múltiplos e charme de atriz francesa decadente. É preciso muito mais do que te dar branco e pós mágicos. O que você precisava era de paz. E aqui estou eu. Turbulenta, ainda que serena. Porque sou eu quem te acolhe nos braços a cada vez que você estoura e tenta dar pelos canos - e tudo estoura, afinal, você não sabe lidar com suas veias e artérias. Você precisa de muito cuidado, meu bem. De alguém que abdique da própria vida apenas, e tão somente, para se dedicar à sua. Alguém que te acalme em suas crises de insuficiência - renal e psicológica e, até, às vezes, artística. E que te inspire, e cumpra com os deveres de musa. Sendo sempre intacta e sendo, às vezes, inalcançável - para os outros, estando sempre ao seu alcance quando for de seu interesse. É preciso babar por você, mesmo que você cuspa no prato em que comeu e, muitas vezes, repetiu. Meu bem, te achei! te achei! te achei! e, exclamando tão entusiasmaticamente assim, posso pensar que eu mesma estava sem rumo. E penso um pensamento deveras correto. Porque estávamos, afinal, no mesmo buraco - aquele em que te encontrei. E tudo bem esse meu jeito de levar a vida à procura da sua, porque amor é isso mesmo, adoração. E eu te adoro, e te amo, desse meu jeito infalível e infindável. Porque, em algum momento, que nunca descobriremos qual, me deram essa missão - quase impossível - de te amar. Incluindo, principalmente, todos os seus defeitos. Que, por acaso, são incontáveis. E que posso, inclusive, dizer que são basicamente tudo aquilo que te compõe. Você é o ápice da desgraça, é a própria em êxtase numa trama inconfundível. Porque, duvido, que existam outros por aí como você. E se existem, eles não possuem nem um terço do potencial que você tem. Meu bem! como você consegue acabar com tudo. Então continuemos assim, meio encontrados, meio sem rumo.

terça-feira, 4 de janeiro de 2011

Carta Direcionada.

Abri você, para uma perícia meticulosa. Com muita cautela, para que não se desmanchasse, não se desfizesse e escapasse com a brisa mais leve que passasse. Na palma de minhas mãos, você era ainda menor do que de pé, no meio do mundo. Meus dedos ficavam, a cada nova descoberta em seu corpo, mais tensos e rígidos. Não sei pelo que deve ter sido atropelada, mas estava cheia de sangue seco e fraturas. E mesmo eu vendo, e sabendo, de tudo, você ainda me olhava como quem houvesse visto, e como quem soubesse, de muito mais. De tanto mais. Tão juvenil e inocente, se não te conhecesse há anos, juraria, pelos seus olhos e coração, que havia nascido no dia de ontem. Ontem, que foi um dia em que resolveu se libertar das correntes que amarrou a si mesma. E destampar a boca, e abrir para qualquer um que te mostrasse qualquer caminho, qualquer. No dia de ontem, foi você também que quis me machucar por ter te querido tanto. Como quis. Quando você, ainda, admitia ser um ser igual aos outros. Quando você, ainda, não se rasgava madrugadas afora, à procura de alguém que quisesse te querer melhor que eu. Não sei, não sei em que parte você confundiu meu amor com tortura. Não sei em que parte te deixei entender que a culpa era, de todo, minha. Não era, mas é tão humilhante olhar para si mesmo, você sabe bem. É tão melhor atirar nossas taças de cristal e mágoas em cima os outros. Deixe que eu fume este meu cigarro, antes que você o apanhe por seus dedos ásperos e o atire para longe, e se queime um pouco. A verdade, é que você não sabe de nada, querida. E quer tanto engolir o mundo numa bocada só. Mas adivinhe, é o mundo quem engole por aqui. E não adianta quantas vezes se atire numa aventura. Não importa que tipo de aventura seja. Não é assim que você será maior. Não é porque você fodeu com um ou dois, que sua foda será melhor do que a minha. Você não sabe ser como eu. Você não é como eu. Portanto, não tente. Não tente porque isso só te faz ridícula. E isso só te deixará ainda mais fraca. Quando o sol se pôr, e a noite invadir seu quarto branco e frio, e eu não estiver lá, você será ainda mais fraca. E não importa quantas vezes eu te escreva, quantas vezes eu te ampare, não acredito que um dia você entenderá o que está acontecendo agora. De tanto você tentar me roubar, de tanto você tentar roubar meu coração, você está se acabando, tentando roubar partes de mim. Partes de mim que não pertencem à ninguém. Muito menos à você. Eu quem fodo, e parto, e mordo, e não me entrego. Não você. Eu que escrevo e dito as tragédias. Você que fique com seus romances dóceis e adestrados, com seus suores noturnos, que de tanto você não saber, saem das glândulas erradas. As noites e amores à deriva são meus. As paixões devastadores e os pedaços jogados pelo caminho. Tudo meu. Não tente roubar o que nunca foi seu, se nem eu mesmo fui. Eu te quero, não como um dia eu quis. Eu te quero bem. Como quero o bem de tantos outros alheios. E como quero bem às plantas, eu te quero, de vez em quando, para enfeitar meu jardim. De vez em quando, fique atenta. E não, não tente me responder à altura. Não tente me ler, nem reler, você não entende. Você nunca vai entender. Não partilha das mesmas dores, portanto não partilha do mesmo sangue que derramo a cada traço costurado aqui. Vá lá, vá embora, e leve contigo o seu pôr-do-sol, você está atrapalhando minha sombra.

ENTRE TESOURINHAS 12/01



Um pouco de publicidade não faz mal à ninguém, faz? Eu chamaria a exposição de imperdível, se muitos não fossem perder. Mas, quem puder, compareça! É uma exposição coletiva, que reúne muitos aspirantes à artistas, sonhadores, começando agora, com um futuro imenso pela frente! E eu estarei participando expondo algumas das frases deste blog e recitando alguns poemas/textos.
Dia 12/01, das 18h até às 22 (a posição permanecerá por uma semana), no Sebinho da 406 Norte.

"A ideia surgiu de repente, entre duas brasilienses que costumam se surpreender com os trabalhos de quem está perto. Surgiu como um conceito pra ser explorado. E aí foi conversado. Depois de um tempo, aprimorado. Depois de um tempo, já tínhamos escolhido local e a maioria dos expositores. Depois de um tempo foi-se acrescentando palavras e música. Por mais que a ideia tenha ficado muito tempo marinando na tigela, saiu, seis meses depois. Queremos, aqui, apresentar trabalhos de arte, das diversas formas, de pessoas que começaram há pouco tempo. Coisas que estão surgindo. Que estão aparecendo em Brasília; entre tesourinhas e ruas sem esquina.

Quem vai expor:
Adriane Oliveira
Breno Brito
Camila Antunes
Francis Espíndola
Jean Peixoto
Julianna Motter
Liza Mirell
Marina Lara
Rafael Cangussú
Rafael Godoy
Raíssa Melo

Recital:
Julianna Motter

Música:
Paola Lappicy"

segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Pequenina.

É necessário sentir na pele a ardência febril do verão. Mas, por hora, o que acontece é um dilúvio. E está tudo branco, branco-acinzentado. Você só queria ser amada. É compreensível. Por isso as noites jogadas na sarjeta, as fotografias e roupas rasgadas, os tantos porres, os cacos de vidro. É tão torturante achar que não pertence à ninguém. E a sisudez no semblante em que se esconde só revela a tamanha fraqueza que suporta seus ossos e seu fôlego. Seus olhos famintos, atordoados. As rugas na testa rígida, mais pura tensão pré-parto, pré-partida. Você não esconde a preparação para o abandono, porque um dia te disseram que tudo vai embora, e irá, mas não há tempo para se martirizar por isso - sem que isso antes aconteça. O dia está passando nublado - sem intervalos de cor. O céu daqui costuma ser o mais lindo. Ninguém sabe o que está acontecendo. Chove na mata crescida. As gotas escorrem pelos jardins sem cores. Não há vida. E se há, onde foi parar? Se perdeu cruzando os Eixos, mirando o horizonte que, daqui, é finito. A gente não se entende mais, e dirigindo pela Avenida das Nações, não temos mais rumo. Entre tantos caminhos, não temos um rumo. No asfalto, as cores do inundamento. É terra que vira lama, é lágrima que vira chuva. E você, pequenina, que não sabe nem por onde veio, nem por onde passou. Não foi pelos becos, não há becos. Nem atravessou as esquinas, nunca existiram esquinas. Não nos nossos Planos. Não aqui onde somos pilotos. Pilotos desse avião desregulado, desamparado. Com um peso enorme por volta das asas. Ainda somos jovens e por isso gritamos. Gritamos sem que haja motivo, não devemos nada. Você que carrega essa mágoa inconfundível. Que é dona dessa beleza incompreensível. Você que me olha agora, logo eu que sempre fui desiludido. Não há nada a ser feito, ninguém pode te amparar. Não há nesse nosso jeito nada que nos explique por quê não há mar. Acendemos um cigarro, você diz que estamos nos matando. Eu acendo uma luz na sua vida, você diz que estou te cegando. O quê tanto você quer, pequenina? Que ninguém parece capaz de dar. Não sei se é um coração para chamar de seu ou um colo para quando desabar o céu. Já está tarde demais, a chuva está caindo lá fora. E pelos vidros podemos escutar o barulho do vento. E nada te acalma, nada de aquieta. Ninguém nunca disse que seria fácil, contudo, poderia ser ainda mais difícil. É quase um masoquismo tentar se manter vivo. Mas tentemos, pequenina, tentemos. Porque, querendo ou não, e mesmo sem saber o caminho, estamos juntos. Sou eu aqui contigo. O colarinho da camisa me enforca, e eu faço círculos em volta do meu pescoço. Estou me degolando para continuar vivo. Que tortura essa que não tem nome. Você é tão transparente que é possível enxergar as águas do lago se movimentando por detrás de você. E é possível ver seu sangue escorrer, e cair nos buracos, e escoar pelo esgoto. Todas as suas dores estão indo embora com a água da chuva, todas as suas mágoas e rancores. Quem sabe, assim, você não melhore, e sobreviver até pareça mais fácil. É tão inconsequente caminhar pelas noites sozinho. Ainda mais você, que é tão atraente e frágil. Ainda mais você, que quase se entrega à menor demonstração de carinho. Você só queria, e só quer, ser amada. Mas exige tanta vontade se manter nos Eixos. E há tanta gente do lado de fora, tanta gente que não vale um tostão, quanto mais um sorriso seu. Eu adoraria ganhar seu primeiro sorriso, pequenina. Porque, pela dureza de seus lábios, eu posso ver que você não sorri há muito tempo. Sentir o vento frio bater nos dentes é algo tão renovador. Ver os lábios quase congelarem, e se tornarem cada vez mais arroxeados. E sentir na contração das bochechas, no alongamento dos lábios, aquela pequena linha que divide o lábio inferior em duas partes - uma mais tentadora que a outra -, rasgar e jorrar sangue, é algo tão saboroso. Eu limpo seu sangue na minha boca, que já está roxa demais, que já está sedenta pela sua demais, que já está desejosa demais. Você só queria ser amada, pequenina. Mas será se seu pescoço dói tanto assim à ponto de não conseguir olhar para os lados?

domingo, 2 de janeiro de 2011

Sara Flávia.

Confesso que são tentadoras as explosões de hormônios, peles, sensações, e pensamentos, por detrás do processo pré-paixão-avassaladora. É tão precioso aquele único olhar em que vemos em nós toda uma esperança de mutualidade. E jogamos todas as cartas. Erguemos as mangas e, inconscientemente, estamos leves. E livres. Graciosamente livres. Prontos para arder de febre e quem sabe, quem sabe, passar as noites acompanhado. Cadê você? Aonde está você? O que está fazendo? Com quem tem andado? Cadê você? Eu quero te ver. Preciso te ver. Te saber, como um todo e por partes. Acho que estou sofrendo, de verdade. É algum mal, ao qual ainda não deram um nome alemão, ou sei lá nome de que língua dão pra essas coisas. Mas também não sei se é mal mesmo, mas é alguma coisa. Alguma coisa grande, e pesada, porque eu quero falar com você, e te ver, o tempo todo. É desesperador achar tudo bonito. Tudo, em você, é tão bonito. E eu quero te roubar para mim. Vou planejar um sequestro relâmpago. Estou ficando louco, e criminoso, e perigoso. Mantenha mesmo a distância. Mentira, não mantenha não. Chegue perto, e diga que me quer. Só quer a mim, e mais ninguém. Diz que eu basto, porque eu posso tentar. Estou tentando. Estou tentando tanto. Fico te olhando em fotos, em lembranças. Eu olho para dentro e só vejo você. Como é engraçado, e bonito. Sim, também é bonito. Só ter você, só ver você. Viver de você poderia ser algo tão bonito. Respirar seu nome, me alimentar de sua pele, viver à sua sombra. Eu e você, poderia ser algo tão bonito. E me sobe um calafrio pela espinha. Minhas pernas enfraquecem. Tudo coça, tudo incomoda. Cadê você? Não estou me encontrando. Você também sou eu. Deixa eu ser você. Só por uns instantes - soma de uma vida inteira. Há tanto tempo não encontro tempo para me sentir assim. Que vontade de cantar. Eu poderia cantar para você, você sabe. Aquelas lindas canções de amor. Arriscar ser desafinado com o Tom. Ou só assobiar. Eu posso te cuidar direito. Todo mundo precisa de alguém. É tão difícil se sentir assim. Estou tão disposto. Sua aparição me fez tão bem, estou desejando tanto bem. Estou te desejando tanto, assim, bem perto. Meu corpo parece que vai explodir. E minha boca está no coração. Meu coração está na boca, na ponta da língua. Mesma língua esta que te fala. Que te escreve. Eu te escrevo tão bem. Pele serena, olhos morenos, tão delicada, com uma constelação de estrelas sobre o rosto. Você é todo o céu. Eu posso ser todo seu. Eu quero. Você só precisa deixar. Tão bruto se apaixonar de novo. E pular dos mesmos abismos. E reviver a sensação de voar livre. Pule comigo! Uma hora a gente volta. Eu prometo. Eu prometo tudo. O que você quiser, está prometido. Está muito cedo, mas eu já te amo. Te amo por antecipação. Eu te amo por ter me feito sorrir. Eu te amo por ter me feito sorrir de novo. Como é doce saber que você existe. E tão feliz. Tem momentos na vida em que só existe desespero, e maços de cigarro, e goles amargos, e solidão. Mas já que você existe, e eu sei, é tudo tão calmo. Eu não posso viver assim tão longe. A saudade mata. A gente mata a saudade, ou ela nos mata. Tanto faz. Não, não tanto faz! Tudo estou fazendo. E cadê você? Apareça, dê notícias. Não aceito um telegrama. Mas um telefonema já basta. Como me acalma ouvir sua voz. Fica tudo bem. Levei tanto tempo para poder dar um cheiro ao seu nome. Cheiro de flores, as mais belas e vistosas. Apanhei pelos campos da vida. Campos minados, de repente você me explodiu. É sobre esssa explosão de amores que te falo. Basta um olhar. Um olhar e já estamos desarmados. A gente sempre sabe quando é de alguém. Podem passar décadas, uma hora chega. Existe um pacto de almas que é selado em alguma parte da vida. Ou da morte. Mas existe. O meu foi selado assim: eu e você, e você, POR FAVOR, comigo. Não estou desesperado. Apenas tenho pressa. É tão fácil errar o caminho. A vida tem tantas estradas. Seu caminho sou eu, só pode. Porque meu caminho é seu. E eu sei. É tão fácil ser sozinho. Então vamos enfrentar isso juntos. Porque é tão fácil reclamar da vida, se embriagar, dormir com alguém, e ser sozinho. Já passei tanto por isso. Já fui sozinho em tantos lugares. Já fui sozinho tão bem acompanhado. Vem para mim, ou então, ou então me ensina a ser só. Me ensina a ser só. Porque desde que você apareceu eu não sei mais. Eu não sei. Faz alguma coisa, essa sua indiferença me mata. Por quê você não vê? E olha, eu estou me esforçando.
Me ensina a ser seu. Ou me ensina a ser só.

sábado, 1 de janeiro de 2011

Ano Novo.

Por mais distante, por mais errante, por mais silencioso, por mais doloroso, por mais equivocado, por mais desiludido, por mais delicado, por mais tudo isso que fomos. Por tudo mais, e mais de nós. Que venham as novas estações. E os novos amores, e tempestades. Que venha a chuva. Que cubra o Congresso, e nos vista de branco, de cinza, de lama. Que abra o sol. E abra nossos peitos. Que sejam novas as dores. Que cicatrizem. Que firam. Que doam. Que cresçamos. Meu amor, que tudo isso passe. E passe rápido. Como passam os anos. Como passarão. Os passarinhos. Tudo canta. O céu se explode em cores. Ainda passo na frente do seu portão. Só para ver se te encontro. Você que nunca quis ser encontrado. Ainda procuro seu abraço na madrugada fria, nos rostos pálidos. A lembrança fica feito tatuagem na pele, e arde. Mas cicatriza. Por mais amor, sejamos sós. Sejamos sós e sejamos sós, por mais distantes. Que a distância cura. Sejamos o novo agora. E deixemos o passado para trás, por hora. Me embebedarei de esperança. Terno novo e barba feita. Passado desfeito em luz. Céu estrelado, mas amanhã chove. Há de chover. Que caia tudo, e se despedace. E se transforme. Já estive aqui. Já sentei neste mesmo chão. E fiz planos. Meia-noite e a gente pula as ondas. Não tenho ondas para pular. Não tenho mar. Nem mar! Ando tão leve, tão manso, tão juvenil e abobalhado. Meu amor, eu não quis, mas estou apaixonado! Pela vida, que é tão intocável. Pelas mulheres, que são tão atraentes. Por tudo que me cerca e que me prende. Estou tentando ver tudo de forma clara. E fumo um cigarro, folheio um ou dos livros, rodopio na cama. Eu poderia voar, você sabe. E ir para longe, tão longe que, você nunca mais saberia do meu paradeiro. E nem eu do seu. E seríamos tão breves em nossos desejos que toda a paz já bastaria para saber que você ficaria bem. Você vai ficar, não se castigue tanto. Escuto as cento e oito badaladas vindas do templo budista. Eu me daria bem vivendo essa vida de artista: um porre atrás do outro, um amor para aparar meu coito, tantas paixões alucinógenas. E carreiras e mais carreiras de pó de pombras brancas da paz. Tanta paz! Tanta paz logo virá! Virará o ano, uma nova década. A década perdida dos amores finitos. Estabeleci essa meta de sentimentos medidos. Não mais me entrego, meu amor, nunca mais. Já precisei curar tanto. Agora é só paz, e pele novinha em folha. E órgãos sacrificados, mas enfim resgastados, longe da gangrena e de qualquer podridão. Vida serena, começaremos tudo agora. Já é hora, já é hora! Meu amor, agora me despeço, vou correr em direção a luz. Você viu o céu nesta noite? Assim eu me perco, assim eu quase me perco. E se perder é tão bom, quando não se tem para quem voltar.