segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Sem Cravo, Sem Canela.

Cortou seus cabelos com a tesoura de costura que restou da última personalidade. Tingiu-os de um marrom mórbido. Lutou para não reconhecer suas sardas nos espelhos. Seu rosto rosado carregava marcas de sol em demasia, e marcas de quem sempre fora. "Excesso, por favor. Encha até que o líquido derrame do copo.". Tinha para lá de seus poucos anos e muita versatilidade. Há tempos atrás, trajada de princesa, servia aos Domingos um banquete medieval. Há tempos mais para frente, vestida em uma saia que cobria os pés, catava orquídeas nos túmulos do cemitério. Havia nascido ruiva, quase um incêndio, mas nos tempos em que evitava-se, havia sido até parcialmente indígena. Sua casa vivia cheia, muitos homens, todos presos a algum marco histórico. Lordes, viajantes, descobridores, magos, magoados, homens. Os incontáveis álbuns de fotos entregavam sua alma aventureira. Louca, diriam. Insana, exclamariam. Segurando um copo d'água, deixava que o líquido incolor escapasse. Tinha sede de vida, de todas menos a dela. O que pudesse ser, sempre seria. Mas nunca, nunca, nunca, Gabriela.

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