terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Mentira Para Dar Pé.

Foi falando de amor que fez com que eles chorassem. Tinha aquela presença de homem derrubado pela vida, um cavanhaque mal-feito e cílios dourados. Em momento algum tornou o amor que partilhava físico. Não citou as pernas torneadas que a ela cabiam, nem a forma como seu corpo saltava por seu vestido florido. Limitou-se ao modo como ela negava um abraço antes de dormirem cansados, e ao modo como ele acariciava o corpo dela apenas flutuando sua mão sobre o ar e satisfazia-se. De pé, em frente a todas aquelas pessoas que, desinteressadas, olhavam para ele quando lembravam-se, contou a estrada que havia tomado para estar ali. Falou de todas as drogas, especialmente daquela que escorria dela. Esqueceu-se de apresentar, mas ali era alguém apenas, sem nome algum. Estava com sua ferida parcialmente aberta, e dela escapava um pouco de sangue. E foi falando desse amor ensanguentado que fez com que eles chorassem. Demorou até que conseguisse falar o suficiente para olhassem-no nos olhos, e quando conseguiu, emprestou suas lágrimas para eles. Aqueles eram seus velhos amigos, aos quais havia abandonado. Ela não gostava deles, nunca gostaria, nunca gostou de ninguém. Foi olhando nos olhos de quem havia abandonado que, envergonhado, disse: "Poderia perder a todos vocês, duas vezes por dia, setecentos e cinco por mês, podia matá-los com minhas próprias mãos. Mas nada faria sangrar-me tanto, e agora eu só preciso que escorra...".

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