terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Carta(da) Final.

Livre de todos os vícios, tendo acabado de abandonar o ócio, cá estou eu, sob um teto infiltrado, dedicando-lhe palavras que furtei de um dicionário. Empoeirado, deu-me uma crise alérgica terrível, enfraqueceu-me os pulmões. Sempre fui, por natureza, fraco, e enfraqueci-me ainda mais com o tempo que tanto soneguei. Frente a esta tela, de tantas polegadas que não fui capaz de contar - sim, queria sabê-las, para dar tamanho as letras -, escrevo-te uma carta de ano novo - por tantos dias envelhecido. Quero que saibas que aparei os cabelos, cultivo agora alguns cachos dourados de velhice. Tirei todas as tentações do meu cardápio, alimento-me agora de vento, e oras, como tem faltado nessa cidade desértica. Quero contar-lhe também de meus planos, pretendo escrever um livro de memórias, daqueles tempos que quis passar na Dinamarca, mas acabei por passar trancado em casa. Há duas semanas fui ver um médico, de óculos sutilmente largados no nariz, deu-me uma notícia ótima! É maligno, indestrutível e tarado por novos territórios. E, minha cara, caríssima minha, para sua imensurável felicidade, estou parando de fumar, mas antes, pouco antes, pararei de respirar.

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