quinta-feira, 29 de outubro de 2009

Toda Noite Tem Seu Fim.

Todo dia acordava e ia alcançar, no fundo de seu pulmão, seu quase nulo fôlego. Aproveitava-o como se fosse o último. Não ficava contente até que a última molécula de gás carbônico saísse de seu corpo. E então descia até a cozinha, pesado e cabisbaixo, e saía a ignorar todos que estavam sentados à mesa. João tinha sua pouca paciência e seu muito mau-humor. Todo dia exibia-o pelas avenidas. Quando o mundo dava azar, João inspirava cortado, e saía a reclamar. Fazia luto, fazia céu encoberto. O arrastar de João era sinal de maus agouros. E João era ressaca. Desnecessárias eram as ofensas e palavras rudes, quando ele aparecia, apareciam compromissos no dia de cada um. João, diziam por aí, tinha sido o mais próximo do desagradável já visto. Olhando por detrás, assim, bem de longe, pode ser que dissessem que João valia ser notado. Parecia simpático, agradável. Mas a proximidade dava ênfase a seu humor insuportável. João era mesmo ressaca, Domingo monótono extendido em cima da cama. João era a soma de todos os amassados de um cobertor, inclusive - e principalmente - os sujos, e das marcas da noite anterior que deveriam ter. João era motivo para deprimir-se, ignorar, omitir-se. João era a mais pura forma de tristeza. E a mais limpa forma de alegrar-se era assistí-lo reclamar sem perder um palavrão da Língua Portuguesa. Ah! João era mesmo ressaca! Quando era achado pela vista, ficavam a revezar-se entregando copos d'água.

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