segunda-feira, 19 de agosto de 2013

O que coletei dos dias

a cura dura durará - 

ser presença
onde a ausência
te emudeceu

abraço apertado na noite fria
abraço calado na cama vazia

silêncio
e pó

silêncio
e só

juntos justos
tão apertados
que é preciso
prender o ar
para caber
que é preciso
ficar sem ar
para soltar

ser colo
ser céu
e ser seu

ser chão
onde os pés
lhe faltarão

a cura
dura
durará

a carne
fraca
nos sustentará


do que é o amor - 

amor é
essa incontornável
vontade
que te beija a boca
emaranha no cabelo
pendura no pescoço
morde o coração
abraça a alma
e arranha-céu


sendo sem querer -

foi sem
querer
querendo
que te encontrei
na rua
meio-dia e meio
queimando de sol
não sei se dezembro
ou se janeiro
não sei se tempo
ou se alguma coisa
no vento
não sei se deveria
mas sei que deixei
que fosse sendo
sem nem saber
que assim
foi ser
querer
e querendo
que me encontrei
em você


cometas e sentimentos cometidos -

das coisas lidas, jamais vencidas, jamais esquecidas e que nos escapam pela boca até o borrão de letras, sentimentos e cometas no papel:

quando a gente
está tão junto
que não sabe
se-r-parado

borrão:
o não saber
se continuo
ou não
a não-escolha:
atire-se
ou encolha-se


o ser querer querendo da vida - 

ser humano
ser espaço
ser amor
ser-ti-mento
ser poesia
ser som
ser silêncio
certeza
nenhuma
ser feliz
e nada
mais


o quereres querendo -

assisto ao sol:
o alcanço
com um anzol
olho para a lua e
decido que será sua
o azul do céu
me cai
como um véu
a rima da dor
perde pra alegria
não quero ser poeta
quero ser poesia


brancazulado poente - 

o pôr-do-sol hoje
tá pra pôr-no-céu
e deixar por-lá


côncavo e convexo -

como cavo
com versos?


o desconhecido -

quem és tu?
tu que não conheço
tu que não vejo
tu que sequer imagino
tu que é tão sujeito quanto eu
tu que deveria ser você
mas que se esconde
por debaixo
de saias cultas
e regionalistas


da disforia eufórica -

a gente vem sendo felicidade
a gente vencendo tristeza


poesia urbana -

te reconheço na rua
te recomeço na cama


Metade crônica metade conto do incontável amor passado -

De antemão, alerto que não prevejo os amores futuros. Não sonho e nem me angustio com eles. Sobre o amor presente, é plural: os sopros da vida. Que invadem pelos mais diversos orifícios e me abandonam como suspiros. Eu li, em Freud, que para o mínimo entendimento, o presente tem que se fazer passado. Eu escrevo sobre o que me parece inteligível.. Escrevo sobre a menor partícula que apreendi do amor. Uma partícula que me é íntima, mas também estranha. Não a enxergo nitidamente, não me tem formato, mas a sinto e a imagino. Algo que, em mim, borbulha e outras vezes levita, quase sempre imperceptível. Esse é o meu amor passado, o que alcanço dele e que posso repassar por palavras.

Escrevo, logo não sei quão distante estou do que sinto.

Sabe...sabe o que é mais engraçado? É que, de alguma forma, a vida que eu escrevo é a minha vida. Mas fora do papel ela não é tão bonita. Nem tão parecida com a vida dos outros. E se eu não a escrevo, ninguém me assiste vivendo, chega e diz: ei, eu também sinto isso. E nem chora comigo. Ou sorri. Está todo mundo muito ocupado achando que é único no mundo. Mas no fundo somos todos a mesma pessoa. Só os sonhos que são diferentes...


Menos censura, mais sinceridade - 

Lembrar que cada homem, todo homem, é feito de porpurina e coágulos. De labirintos e flores. Que não há porque se perder, há sempre um caminho. Amar. E não desistir nunca. Se não for um mesmo amor para sempre, que sejam novos e outros. Mas amores. Nunca menores, nunca mais algo, ou menos outra coisa. Mas completamente amores. E se seu amor parecer errado, então é amor de verdade. Todo mundo tem medo de perder. Mas é todo mundo orgulhoso demais para fazer o que é preciso para manter qualquer coisa viva:

amar,
ainda que,
vez em quando,
doa.
Doar-se
para não
doer-se
tanto


dos rabiscos no caderno -

amor é a frase que continua pela beirada mesmo quando a linha do caderno já acabou
que se recomeça
que se reinventa
mesmo quando
(parece que)

já terminou

conselho que te dou de graça -

se ausente
de tudo que,
quando presente,
não te arrebente
o peito


e que depois cobro -

nada mais justo:
se é olho por olho
quero ainda mais apertado:
coração com coração

dos abraços que são sem ser -

Boa noite, desejei
desejando
a ela e a noite
Bom dia, disse ela,
pois já era dia.
Poesia, disse eu,

pois já era ela.

a conclusão -

Encontrou
despertou
abraçou
escorregou
beijou
entregou
recebeu
e dividiu:
amou
mas um se cansou.
Logo mais, 
o outro repetiu.
Se poesia tem,

que mal, bem?

o que fica é o que vai -

o vento leve traz
o que o
              t
                e
                   m
                       p
                          o
                                leva
tudo muda
o tempo
odot

e o que é tudo isso -

poesia:
é querer que os outros enxerguem
o que a gente sente
sem nem ver

3 comentários:

Anônimo disse...

Excelente, Julianna! Parabéns!

Anônimo disse...

Quantas declarações de amor podemos receber... pela beleza que temos?
Quantas declarações de amor podemos... por um blog que escrevemos?
Quantas declarações de amor... por deixar as palavras brotarem?
Quantas declarações... pelo que realmente somos?
Quantas... por ser gente de verdade?
Quantos compartilhamentos podem ter os sentimentos alheios?
Não vivamos de quantidades e sim de qualidades.
Eu partilho. Você partilha. Nós nos partilhamos.
Que seria da humanidade
Se pessoas como você
Não soubessem escrever
Até aquilo que não se sabe?

Que bom morar em Brasília
E por acaso
Acasos
Cruzar pela calçada
Com alguém que eu
Amo ler
Queria eu poder falar abertamente
Com todos os meus escritores
Que me fazem
Transcender

Nunca permita que te definam
Por aquilo que simplesmente
Não pode ser definido.
Inefável
Pesquise essa palavra

De sua leitora assídua
Cissa

Anônimo disse...

Juliana, algumas de suas palavras espalharam-se por Buenos Aires. Eu as li, e por isso passei por aqui :)

(santo google)

Parabéns!

Tatyana França.