quarta-feira, 17 de março de 2010

Sutileza.

Estava de olhos tampados, tampados pelas mãos de outra, mas quis olhar. Pedi licença, e que alcançassem meus óculos. Agora eu era míope, míope apenas. Equilibrando um garrafa na mão, ou uma mão na garrafa, observei-te de perto. Foram teus olhos cor-de-ventania, e tua cicatriz apontando singelamente por debaixo do queixo. Tuas mãos eram frias e ossudas, e tua voz encantadora. Escondemo-nos por detrás de uma ligação telefônica, por detrás de um passeio noturno. Enlaçamo-nos depois de algumas garrafas de vinho, que então caíram e ecoaram. Pedimos por sigilo, agora só peço por silêncio.

Um comentário:

Hanna disse...

Por diversas vezes vendaram-lhe os olhos. Mãos ásperas, grandes e rudes. Macias , delicadas e reduzidas. Ossudas, gordas, geometrizadas.Mãos que trouxeram-lhe o escuro, mas não obrigaram-lhe a ficar nele. Prolongar a cegueira foi opção. O calor de outras mãos aquecendo-lhe os olhos frios e escondendo suas olheiras.O suor de outros dedos compartilhado em seu rosto. Conforto, comodidade. Não via, portanto precisava de guia. Quem cega é quem leva e é tão mais fácil deixar-se levar..Uma hora, porém, os joelhos cansaram das mesmas dobras, dos mesmos passos. Desacompanharam o ritmo do condutor. Freiaram os pés, as pernas e a vontade. O olfato já não suportava aquele cheiro salgado.Os olhos encontravam-se saudosos de liberdade.Parou e pediu pela saída do preto. Voltavam as cores. Voltavam acompanhadas de mãos novas. Mãos que tampariam-lhe os ouvidos. Se não escutasse, não falaria. Silêncio (induzido).