terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Xis.

I.
E hoje, hoje que não é amanhã. E que não será tão cedo. Embora ainda seja cedo o hoje. E que amanhã já será tarde. Não vou te deixar ir. Por mais que queira, e eu saiba, e você repita, e isso me doa. Não quero que se passem as horas. E o sol acorde. E eu me levante. E você se vá.
II.
Eu tenho que ir, é como se houvesse chegado a hora. E acabou nosso tempo. E foi tudo um sonho. Que vivemos com todo o cuidado. Mas acordamos do sono. Os fios se romperam, os laços também. Preciso me afastar de você. Precisamos estar longe. Tente me fazer ficar. Tente me impedir. Eu quero ir, mas não sei. Eu quero que você vá comigo, mas não dá. Eu vou.
I.
Estou sofrendo, passam os dias e eu já não te vejo mais. Já não me vejo mais. Você se foi e me levou contigo. Virei um corpo, que não sabe mais nem dizer se está vivo. Dizem que estou ficando louco. Digo que você me levou à loucura. Desde o primeiro momento e, desde então, eu permaneci. Continuo a te esperar. Sei que você não volta, mas eu me engano. Preciso disso. Não sei o que fazer. Não sei se te espero calmo, ou se te procuro desesperado. O que você me diria? Por onde tens andando? Quem tens amado?
II.
Não sei onde estou. Sei, mas não posso te dizer. Eu não quero que você me encontre. Eu quero que você me sinta, me fareje, e apareça. Como apareceu da primeira vez, um cometa descendo do céu. Coisas como essas acontecem a cada milênio. Está difícil esperar. Antes a vida vai me levar embora. Se é que já não me levou. A vida me levou de você. Estou existindo. Uma flor quase murcha no meio do deserto. Você deveria ter me salvado.
I.
Era um transtorno, e me recuso quando dizem que de bipolaridade. Estávamos transtornados porque nosso amor não cabia nos metros e centímetros de nossos corpos, ainda que somados. Nosso amor merecia o mundo, ou até o universo. Tenho te esperado, mas o tempo corre. Tenho medo de ser arrastado. Tenho te procurado pelas ruas, feito um cão faminto em busca de carne. Sua carne faz falta na minha. Não me toco, não me aceito. Meu corpo me recusa, em busca do seu.
II.
Não sei se você já está ficando grisalho, mas meu rosto já se encheu de rugas. Por muito tempo, chorei muito. Ainda choro, quando me lembro. Eu não te esqueço. Tive que ir, ainda não sei para onde. Estou tentando encontrar meu lugar. Não tenho pertencido a ninguém, desde que me emancipei de você. Diria que sinto sua falta, mas tudo que eu sinto é dor.
I.
Eu deveria ter te puxado pelos cabelos, ter prendido seus braços na cama, ter grudado seus lábios aos meus. Pois era sim que pertencíamos: juntos. Nem tudo está perdido. Mas agora eu sou um nada. E não sei por onde ando, se respiro, se eu como, quem eu como. Perdi o tato, a visão, todos os sentidos. Sofro que nem uma cria desmamada. Não tenho mãe, pai, nem destino. Abandonei tudo, ou fui abandonado. Desde que você se foi, estou sendo o que posso, estando aqui, parado.
II.
Ontem conheci um homem, que me lembrou de você. Tem sido assim, te vejo em todos os lugares, todos os seres, inclusive os inanimados. Fomos para a cama, não houve nada de especial. Só um choro finalizando o ato. Fim da ópera, sem aplausos. Eu fugi. Foi de você ou de mim?
I.
Até hoje não entendo porquê você se foi. Procuro respostas. Ainda assim não me movo. Tomei uma decisão, vou desafiar o mundo. Você se exilou de mim, agora me resta te procurar em todo o resto. Tenho me envolvido com tudo que machuca. Escrever é de uma dor enorme, e eu grito. Tenho escrito para colocar para fora. Estou te exorcizando de mim. Mentira, isso seria tentativa de suicídio.
II.
Eu quero voltar, mas me mantenho firme. Você nunca me aceitaria de volta. Você nunca correu atrás. Mal sei se ainda se lembra do meu rosto, e de como ele soltava alguns sorrisos. Meus dentes, agora, ficam guardados por detrás de um par de lábios finos e sem cor. Tenho sido beijada, e mais parece um atropelamento.
I.
Quantos anos se passaram desde que você encheu suas malas e me deixou vazio? Abandonei os relógios. Estou vivendo com outra mulher. Somos dois fantasmas. Ela ainda sofre por um outro homem. Eu ainda sofro pelo meu único amor. O único momento em que estamos juntos é durante o sono, porque nos encontramos em um mesmo planeta, o dos sonhos.
II.
Estou voltando para a cidade, queria te encontrar. Mas não sei se mudou de endereço. Bem provável que tenha mudado de mim. Vou passar na frente do seu prédio, e se ainda houver alguma luz acesa, talvez eu toque o interfone. Você não me procurou, mas isso não me impede. Se o amor que eu tenho seja mesmo só meu, com ele eu faço o que quiser, até te obrigar a aceitá-lo.
I.
Larguei a tal mulher. Ou ela me largou. Não sei. Também enchi algumas malas, e deixei que ela ficasse naquele mesmo apartamento em que você me deixou. Passei muito tempo sendo sufocado pelas mesmas paredes. Nunca mudei a pintura, nem sequer um móvel de lugar. Estou pensando em viajar, talvez Veneza, talvez algum lugar aonde eu te encontre. Nunca te perdi. Aqui de dentro, você nunca saiu.
II.
Passei em frente ao prédio. As luzes estavam todas apagadas, mas eu vi que as cortinas não eram as mesmas. É uma outra pessoa vivendo lá. Ou outras duas. Alguma história que nunca chegará aos pés da nossa. Nossa história se perdeu, eu te perdi, você me perdeu. A gente se partiu, eu parti, e nunca mais voltei.
I.
Eu somente te encontrei porque tudo me levava a você. As gôndolas, boiando nas ruelas banhadas de água. Água que sobe não sei quantos centímetros por ano. Não consigo me ver morrendo afogado aqui. Mas me afogo, ainda, em lágrimas, e em garrafas de vinho tinto. Porque me lembram da cor do sangue, dos seus lábios jovens, do amor. Continua doendo.
II.
A cidade continua a mesma, e sinto saudades suas. Voltei a fumar, acho que pelo frio. Ou porque sei que você se orgulharia de poder dividir seus maços comigo. Haviam sempre aqueles momentos de fumaça e melancolia. Ou fumaça e sossego. Ou eu e você nos fazendo companhia. Preciso viver, e te esquecer. Não consigo.
I.
Eu deixaria você voltar. Para me partir. E não partir sozinha. Que levasse um pedaço maior. Que esse pedaço estivesse vivo, contigo. Tenho vivido de você. Eu tento, elas tentam, me abraçam, me beijam, mas eu não quero te esquecer.
II.
Cansei de te procurar, não sobrou nenhum rastro. Ninguém sabe que rumo você tomou. Ou se você ainda está vivo. Sua morte seria uma espécie de cura. Sem esperas ou procuras. Se você se foi, tudo acaba. Até mesmo eu. Está na hora de voltar para a Itália. Sempre sonhei em estar contigo lá. Mas estive sozinha em todo tempo que vivi naquele país. Eu te vejo vivo em todos lugares. É chegada a hora de você morrer em mim também.
I.
Rodei do Sul ao Norte. Tudo tão bonito, como as coisas deveriam ser. Mas eu encarei de um modo triste, não tirei fotos, ocupei a mente, está na hora de te deixar ir. Estou voltando para o Brasil. Alguma coisa deve me esperar por lá. Você não esperou tempo o suficiente para que eu te encontrasse. Você não quis, você se foi. Eu preciso aceitar que você me matou em si. E que eu preciso recomeçar a viver em mim.
X.
Quando o fim, chega ao fim, não há recomeço.

3 comentários:

cora disse...

lembrou aritmética, da fernanda young.

cora disse...

digo, a estrutura. e eu nem gosto desse livro, mas acho genial como é montado.

Danubya Medeiros. disse...

Impossível ler,e sair ilesa.
Maravilhoso.