sábado, 5 de fevereiro de 2011

Finito.

Sofremos, como é de costume a todos os amantes. Sobrevivemos, como era de se esperar. Houve uma despedida, seguida de um choro, depois um silêncio, depois outras bocas e, de novo, nossos beijos. Porque era difícil ir, assim tão rápido. E fingir que nunca houvera acontecido nada. Nem nós, nem nada. Quando nos tornamos sós, surgiu uma saudade, uma indecisão. Depois, bem depois, uma indiferença. Foi quando passamos a frequentar os mesmos lugares, mas delimitar muito bem nossos próprios espaços. Se havia um aceno, era um dia de sorte. Se escapava um sorriso, era morte. Porque ainda desejávamos, e o alongamento dos lábios excitava os impulsos. De novo, os beijos. E tudo voltava. Mas logo partíamos, outra vez. Para nossas casas, sofrendo sob nossos próprios tetos. Sozinhos, porque era tão difícil se esquecer. Não me recordo de nenhum outro momento em que eu tenha sido tão profundamente triste. Ou ferido. Com carne-viva e o medo de qualquer toque. Não houve um abandono, nem uma quebra, somente um acordo. Não aguentávamos mais negar que tudo era pequeno demais para nós, e que não haviam formas de sobreviver ao mundo. Não me recordo do seu rosto no momento em que sussurramos o adeus. Mas tenho a certeza de que ficou vazio. No momento em que eu saí de você. Tudo esvaziou, tornou-se oco. Em mim, e em você. Empacotamos tudo, e eu mudei para um lado da cidade, e você para outro. Por um tempo, não nos esbarrávamos, era arriscado. Mal saíamos de casa. Mas acontece da cidade ser pequena, e houve um reencontro, seguido de muitos outros. E seguíamos para o meu quarto, e relembrávamos a textura de nossas peles, e partíamos. Porque, por mais que tentássemos, sabiamos que não pertencíamos mais. Nem ao amor que restava, nem aos braços que se encontravam. Eu me encontrava sozinho, na maior parte das noites. Quando eu não estava acompanhado por outro par de coxas, ou outro cálice de vinho. Eu nunca me encontrava sozinho, não do lado de fora, não quando dentro de alguém. Dentro de mim, bolas de feno rolavam, e a melodia triste do amor vadio tocava. Eu vejo uma noite escura, uma escada de ferro apontando para os trilhos, o barulho veloz do trem, um par de amores caminhando de mãos dadas, um pingo de chuva caindo do céu. O frio, e um gorro esquentando minha cabeça. O coração congelado, uma lágrima caindo do céu dos meus olhos. O céu refletido, escuro e anuviado. A lembrança dos seus cílios, da sua boca, de cada um dos seus traços. A sua raiva me dizendo que te levaria embora. Você indo. A eternidade escapando como fumaça. Um cigarro temendo apagar. O fim de uma era. Um aborto. Nós dois em um lugar desconhecido, nos encontrando depois de anos. Ou até mesmo agora. Ou antes. Um amor abortado, morrendo antes de nascer, escapando pela virilha. Sem dar luz. Sem nenhum de nós dar a luz. E a noite persistindo, escura. E sua lembrança na minha. Sem previsão de sol. Noite eterna. Com previsão de falta. Uma falta irracional. Que doeria em todos. Pois ninguém aguentaria nos ver assim. Antes, sendo tão sorridente e joviais. Depois, não sendo, se arrastando. E nossa história se esvaindo, sendo um amor como qualquer outro: finito.

3 comentários:

Danubya Medeiros. disse...

Encontrei seu blog,parei aqui e comecei a ler.Minutos depois, me senti uma visita numa casa muito aconchegante e convidativa.
Adorei seus textos,adorei o que li.Tudo aqui me agradou deveras,as linhas de sua escrita tem mais que letras,tem alma.Sensibilidade.
Venho sempre.
Te deixo um abraço,um afago.

Bárbara Gontijo disse...

Você é realmente uma das melhores escritoras da nossa época. hahahhaa.
Me diz, por que não pretende publicar nada?

Julianna Motter disse...

Nossa, muito obrigada!
Pretendo, só é muito difícil!