quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Sorte do Dia.

Dezessete cigarros, apagados na sola do sapato, sujo de lama e solidão. Na cidade, há secura e saudade. Do décimo andar de um prédio comercial, vejo o céu. Irrevogavelmente cinza, e limpo, na medida do possível. Já passaram das três da tarde, já passaram apenas alguns milhares de carros na rua lá embaixo. Alguém insiste em bater na porta, gritando com desespero. Não abro, apesar de não estar aqui escondido. Antes de entrar, tentaram me dizer que seria um dia como outro qualquer. E não duvido que seja. Não há silêncio. As buzinas, os freios, as batidas, as canções, estão todas subindo até aqui. Abraçando minhas costas feridas e cheirando minha nuca. Já pensei em pular, e não me sinto especial por isso. Todos sempre pensam, às vezes somente pela curiosidade em saber o que vem depois. O que vem depois? Não sei, ainda vivo o agora, sobrevivo rememorando o passado, as partes dele que não esqueço. A porta agora parece estar sendo espancada, o que considero uma tremenda maldade. A culpa não é dela, então parem. E parem de gritar. E de chamar meu nome. E de atirar papéis com recados. A janela está suficientemente aberta para o que virá depois. E tenho a certeza de que quando chegar o momento, eles estarão aqui dentro, com outros do outro lado, usufruindo do mesmo desespero. Alcanço meus óculos e dou uma olhada na tela do computador. Sorte do dia: não há sorte. Se depois tiver, depois vocês descobrem. Um abraço apertado em seus olhos chorosos, em suas vozes trêmulas e agudas. Acredito na distância e nas palavras. Distante, agora eu vou.

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