terça-feira, 17 de setembro de 2013

Fragmento 4 - das compulsões

com pulsões,
esse amor-músculo
me expande 
e me comprime

Às seis horas já estamos de pé. Eu sempre te olho ainda deitada e te desejo bom dia. Bom dia, amor. E encosto meus polegares próximos aos seus olhos e limpo suas remelas. Você se agonia e contrai os braços. Se de bom humor, ri. E me pede para deixar de ser louco e eu te digo que isso só sou por sua causa. Você ri de novo e deixa a calcinha jogada pelo chão e entra para o banho. Eu tento ir atrás, mas você, mesmo depois de me deixar, não me deixa. Tranca a porta e me diz que só te atrapalho.
Eu sou todo atrapalhado e mesmo correndo para o banheiro, você fecha a porta na minha cara e eu quase sempre bato com o nariz. Meu nariz nasceu primeiro e cresceu mais que o resto. Quando te disse isso, pela primeira vez, você riu por vários minutos. E eu concluí que estar apaixonado dá mesmo mais graça as coisas.
Se de mau humor, você empurra meus dedos afastando meus braços e acaba se arranhando e me fazendo arranhar você. Diz que já está atrasada e que eu só te atrapalho. E reclama que minhas unhas estão grandes demais para um homem. Então critico seu sempre presente discurso sobre a crueldade dos estereótipos. E você me bate a porta na cara. E quase sempre pega no nariz. E eu sei que do outro lado da porta você escuta o barulho da madeira do osso e da cartilagem. E eu escuto e sei das suas costas em atrito com a madeira os pêlos e ossos e o barulho das suas nádegas batendo no chão pouco depois de escutar a pele em atrito com o esmalte da porta e seu corpo deslizando até as nádegas fazerem o barulho que fazem ao encostar inconsoláveis no piso frio de cerâmica.
Eu sei que fica sentada por uns dez ou doze minutos respirando com força com a cabeça para baixo e a testa apoiada nas mãos fechadas. E eu escuto você pensando que queria ser mais calma e mais controlada e que não deveria me dizer o que diz quando está irritada sem saber nem o motivo. Pensa que não deveria nem de brincadeira me dizer que só atrapalho e nem fechar a porta em minha cara porque um dia poderia acabar quebrando meu nariz. Pensa que um dia poderia, até, acabar nos quebrando. Nos fraturando. Fazendo sangrar. Pensa que então eu poderia ir embora. E eu escuto você me pedido para por favor não ir. E alguma coisa que não consigo escutar direito te desespera e você se levanta e abre a porta assustada. Sossega quando me vê deitado na cama e vem com seu corpo nu me cobrir. Respira fundo todos os seus pensamentos que acha secretos e me aperta até dormir. Me aperta até suas mãos afrouxarem e você partir. Amo quando sai para sonhar
e esquece seu corpo no meu.

Um comentário:

Vanessa Vieira disse...

Olá Juliana! Que belo talento o que tens. Gostei demais de tua forma de escrever. Um texto suave, sincero e ao mesmo tempo profundo!!! Fantástico!!!

Vou ficar por aqui para te conhecer mais. Já estou seguindo a página lá no face. Grande Abraço!