segunda-feira, 13 de junho de 2011

Só Pode Ser.


Love is watching someone die.


Da última vez que chequei, amor era coisa de quem não dava a mínima para a felicidade. Sabe, para mim, é como decidir morrer de overdose em uma Sexta-feira à noite, enquanto todos enchem a cara, e falta tempo para, sequer, notarem que você está há mais de duas horas no banheiro. Toda aquela coisa de se entregar, de prometer, de decorar cada uma das manchas do corpo de uma outra pessoa - sem nem ser capaz de enxergar todas as suas. Amor parece coisa de quem tem bastante tempo ocioso. Porque não é possível uma pessoa, com ocupações e horários, encontrar tempo para se deitar no gramado e ver formas nas nuvens, e suspirar. Não, não é que eu tenha me amargurado ao passar dos anos. Não é que eu tenha alguma incapacidade e isto que eu estou falando seja reflexo de alguma inveja que enxergo e ignoro. É só que se a gente parar para pensar demais nessas coisas, a gente acaba se tornando cada vez mais e mais cético. Basta olhar para os lados, aumentar o volume do rádio, passar na frente de uma vitrine de livraria, ir ao cinema. O amor não faz ninguém feliz. Sim, há quem ande de mãos dadas e sorria. Mas, pessoalmente, acho que isso é mais uma questão de afinidade. Um reconhecimento mútuo. Sabe aquela coisa de olhar nos olhos? Que chamam por aí de "amor à primeira vista"? Se acontece, é quando a gente sabe, logo de cara, que passaria horas e mais horas encarando o tédio na companhia da tal pessoa. As outras formas de amor se dão por insistência. Tenho um casal de amigos que levou mais ou menos uns dois anos para que realmente se importassem um com a opinião do outro. Antes, só sabiam dialogar na cama. Ficaram casados por dez anos, assinaram os papéis do divórcio na semana passada, quando perceberam que realmente haviam desperdiçado tempo insistindo em uma coisa que não existia e que nunca havia estado lá. Eu precisaria de umas quatro reencarnações para me livrar de uma frustração dessas. Sabe, estão todos certos quando dizem que a vida é curta. Ela realmente é. Durante um almoço, você pode ter uma parada cardíaca, cair de cara no seu prato de macarrão, e ser velado na sétima capela do cemitério sem direito à uma homenagenzinha no jornal local. Eu prefiro que não sofra. Mas, se for insistir, pelo menos vá por algo que valha à pena. Sei lá, faça uma tatuagem na costela, assista Titanic, compre um pacote turístico para o Oriente Médio e simule estar perdido por um deserto. Porque o amor - o término ou a fuga dele -, tem a estranha capacidade de invadir todas as camadas que compõem uma pessoa. É por ele que um dia você sorriu e, agora, chora. Ele vai da epiderme ao karma. É feito fosse coisa de quem gosta de apanhar de graça. Faz mais frio quando se perde o amor. E as coisas que tinham vida vão perdendo o hábito de respirar. E os olhos adoecem e tudo perde a cor. Quer dizer, alguém realmente já amou? Ou foi tudo mesmo solidão? Na verdade, eu mesma não duvido de toda a energia envolvida neste processo de amar - ser amado, se desarmar, para no fim, desamar, ser desamado, derrapar, ser derramado. Começa a semana. Termina o amor. Porque, por mais que acordem juntos todas as manhãs, e troquem garfadas na hora do jantar, às vezes é preciso ficar até mais tarde, ou aumentar as horas de expediente, ou abaixar mais a cabeça para dar uma olhada em um par de pernas, e não concordar no canal e ir ler um livro no escritório. A rotina exige uma saída dela mesma. E, também, afasta uns dos outros. Os horários e os compromissos, as tarefas, o relatório atrasado, a mãe que está no hospital, o sobrinho que vai fazer aniversário. É difícil manter um amor na cidade grande. Sem contar que, eu acho que dentro de cada um vive um demônio, e dentro de cada demônio vive uma outra coisa ainda pior, mais impulsiva, e por aí vai, demônio por demônio. E é quase impossível, para qualquer um, se manter calmo quando eles vão acordando um por um. Peças de dominó enfileiradas que, em um toque, se auto-destroem. A gente vive tentando esquecer dos nossos demônios. Os desejos, tudo aquilo que for primitivo. Temos que ocultar as coisas que acordam e nos assustam. Um beijo que foi dado sem ser previsto, a vontade de mergulhar em um decote, de analisar um volume sob a calça, um arrepio que desce pela coluna. O amor exige demais de nós mesmos. Porque ele precisa de medidas e cuidados. E é preciso estar centrado, e ter tempo, e vontade. Ao mesmo tempo, é ele quem nos trai. Que, uma hora, desaparece, vai embora, e nos deixa com aquele mal-estar de saber que estamos nós dois aqui só por precisarmos, ainda, dividir as contas e acertar os papéis. Ninguém tem o que é preciso para revistar uma pessoa e perguntar: ei, você viu o amor que eu havia deixado por aqui? Não? E agradecer, e dar as costas, como se tivesse acabado de perder uma nota de dois reais. Na verdade, se eu for pensar nos meus bons dias, eu até não tenho nada contra o amor. O que eu não gosto muito é de toda a ritualização relacionada a ele. As dúzias de rosas, os bombons, o pôr-do-sol, as luzes de vela. É que, bem, eu, particularmente, não me sinto confortável em ser invadida. E nem de ter partes minhas absorvidas por outros. Por exemplo, eu sempre falei muito palavrão. De repente, eu o amo, e ele me ama, e nós dois decidimos passar todo o tempo que tivermos juntos, e aí ele começa a falar muito palavrão também. Os mesmos que eu. E tempos depois, tudo aquilo some, acaba, e nisso de superar e seguir em frente, ele vai viver com outra, e vai usando os meus palavrões. À partir disso, ele vai amá-la com meus palavrões. E ela vai achar a forma como ele diz "porra" linda - como vai acabar achando, também, todas as outras coisas pertencentes a ele. E aí, além de ter perdido o amor físico - a presença -, o amor supostamente verdadeiro, vou perder a vontade de manter meus hábitos antigos. Eu sei que é bom mudar. Mas é bom, também, manter a essência. Prefiro não escolher o amor, por enquanto, e ficar com a sanidade.

3 comentários:

Marina disse...

É difícil dormir com um amor do lado e um despertador do outro.

Rebelde com (alguma) Causa disse...

amei!! Parabéns, muié

Julianna Motter disse...

Muito obrigada!