segunda-feira, 4 de abril de 2011

Doce Realidade.

Eu só vou falar daquilo que você não quer saber. Dos olhos dela, da força de seus abraços, de como dormimos o sono dos santos. De como ela não me lembra você, nem por um minuto. De como ela te faz ir para cada vez mais longe. De como ela não é você. De como ela tem sido aquilo que você não quis, não pôde...você fugiu. Em um desencontro, eu cheguei com meia-hora de atraso, e você não estava mais lá. Depois disso passei a me questionar se, um dia, realmente esteve. Eu achei ter escutado você dizendo meu nome. Mas era o barulho do vento. Eu confundi a presença das damas-da-noite com o seu cheiro. De todo o amor que eu te dei, você só me deixou a loucura. De tudo que eu te dei, ficou, apenas, um espaço. Um vácuo entre as células. Outro bem no centro do coração. Nas paredes, e na cabeceira da cama. Você arrancou tudo, e será que percebe? Será que notou? Será que sofreu? Com mais meia-hora e dois anos de atraso, você voltou. E queria tudo do mesmo jeito. Foi de revirar o estômago. Você de pé na entrada do prédio abrindo os braços e dizendo voltei. Como se nada nunca pudesse ter mudado. Como se você tivesse feito um pacto com o diabo e parado o tempo. O meu tempo. Do seu pacto, eu não duvido. Você encobria muito bem todos os seus segredos. E se mostrou tão assustada quando viu alguém saindo do carro logo ao meu lado, segurando as mãos que um dia foram suas, e te olhando sem saber quem você era. Acho que isso foi o que mais te assustou. Descobrir que eu não te mantive viva para sempre. Não descarto a possibilidade de nosso amor ter sido apenas uma ilusão de óptica. De nada daquilo ter realmente existido. Nem nosso tempos juntos, nem o nosso reencontro - prefiro, na verdade, chamar de seu retorno, porque ali, a única coisa que eu encontrei, foi a personificação de um pesadelo. Você não demorou muito tempo até subir em cima de mim e tentar me agredir com sua ilusão de amor. Ao mesmo tempo, querendo beijar meus lábios, e querendo pendurar minha cabeça em uma praça. Você me contou, logo no nosso começo, que achava linda a cor e a densidade do sangue. Quanto eu te perguntei os motivos para tantas tatuagens. Eu gosto de ver escorrer, e se virou para a janela. Estava toda nua, mas completamente ausente. Vidrada na velocidade dos carros, ou na velocidade de nossos sentimentos. Fumando um cigarro, e prendendo suas longas mechas de cabelo em um coque. Naquele momento eu soube que era amor, e não só crises de ansiedade. Naquele momento eu te quis mais do que nunca, mais do que alguém um dia poderia te querer - era difícil para alguém te querer tão inflamável como você era. Tão volúvel. Inconsistente. Inconstante. Quando eu achava que você estava em minhas mãos, você escapava. Com o olhar preso às rachaduras do teto, aos títulos dos livros na estante, falando das asas das borboletas e dos signos astrológicos. Você nasceu que horas? Nunca me dei muito bem com escorpianos...e eu só querendo enxergar qualquer possibilidade de entrar em você. Pela boca ou pelos seus outros buracos. Eu me encantava por cada fibra de seu corpo. Por cada um dos seus suspiros. Quando você caía no sono, era quando eu nos sentia mais próximos. E eu me imaginava caminhando pelo seu inconsciente. E você vendo nós dois, bem mais velhos, sentados na varanda. Eu realmente acreditava que existia alguma paixão por mim em você. Que não fosse somente um surto ou um espasmo. Algo que, mesmo intocável, nos penetrasse de forma a nos manter ligados. No dia em que você desapareceu, eu cheguei a pensar que o mundo tinha acabado. Foi ali que ele começou. Quando eu realmente enxerguei o que era a realidade. Não era me sentindo tão preso a alguém que eu descobriria o que era estar acompanhado, ou ser amado. Eu te queria por você não precisar de mim. E, não me precisando, fazendo com que eu te precisasse mais e mais. Foi um vício, um dos mais difíceis de se largar. Se você não tivesse me largado tão desumanamente, eu nunca teria te enfrentado. Mas lá estava você, de braços abertos, fingindo que era amor de verdade, e como fingia tão bem. Não nego que quase acreditei. Mas ela estava lá para apertar meu ombro. E me lembrar que eu era humano. Portanto eu deveria viver a realidade. E não um engano.

5 comentários:

Anônimo disse...

não tenho palavras.

Lucas disse...

Voce gosta de dama-da-noite também? rs Eu adoro dama-da-noite.. tão poético, né?

Danubya Medeiros disse...

O texto inteiro é estupendo, mas esse trecho em particular...sem palavras.
"(...)Eu te queria por você não precisar de mim. E, não me precisando, fazendo com que eu te precisasse mais e mais. Foi um vício, um dos mais difíceis de se largar. Se você não tivesse me largado tão desumanamente, eu nunca teria te enfrentado(...)"

Julianna Motter disse...

1: Eu não tenho palavras.
2: Damas-da-Noite são extremamente encantadoras e poéticas, na minha opinião.
3: Obrigada por, mais uma vez, ler, e comentar, e elogiar. Saber disto me faz muito feliz!

Geovanna disse...

uou