domingo, 13 de março de 2011

Our Blueberry Nights.

Se destruir deveria ser prazeroso? Eu venho tentado descobrir. Parece coisa dos grandes, os semi-deuses sem poder algum - além das palavras, mas que poderes elas exercem além das catarses e epifanias e juras e promessas e desgostos? Li, um dia desses, que Tolstói morreu assumindo a barba e a loucura pegajosa de um profeta e, pouco antes de sua morte, questionou a profundidade dos sentimentos expostos por Shakespeare. Ele foi assassinado pela própria loucura ou foi tentando matá-la que acabou sendo apunhalado pelas costas em um golpe certeiro? Impossível questionar a profundidade sentimental de um homem que acreditou no amor infinito. Pura loucura, questionar a profundidade do poço de insanidade que o levou a acreditar nisto. E escapou pelas beiradas e se derramou no tinteiro e na caneta de pena. Foi com pena que os maiores amores foram escritos. Compreende? Ontem eu saí. Todos saem. Vão e voltam. Eu saí com a certeza de que iria me embriagar o suficiente para não me lembrar de nada, de absolutamente nada, e acordar com um zumbido no ouvido e o peso do mundo sobre a testa. Não há nada mais denso do que abraçar a loucura genética ou natural ou demolidora com uma loucura sintética ou com alto teor alcólico ou esfumaçada. Se bem me lembro, eu caía pelos cantos, e aos pedaços. Nada está batendo aqui dentro, isso eu queria te contar. Queria contar a você, que eu nem conheço. Nada eu conheço em você além de umas linhas tortas, e as jogadas favoritas no poker. Você ganhou as últimas partidas? Enriqueceu? Lembrou-se de mim e pensou que, um dia, eu poderia ser o amor da sua vida? E se eu já sou e você não percebeu? E se percebesse, será que iria me dizer? E vir aqui me buscar, de um outro lado, de um outro mundo, em uma outra dimensão. Quanta lucidez. Tamanha lucidez um dia eu tive. Agora só a vontade de te ligar, e perturbar seu sono infantil. E procurar saber quando foi que eu deixei você me invadir de forma tão violenta. E a vontade de querer saber onde foi parar o amor. Aonde foi parar o amor? Aquele que apareceu de relance, e nós dois pensamos que pudesse vingar. Agora você vem me dizer que eu não sei de nada. Eu não sei de você. Começo a te confundir com um amor antigo, meio querendo dividir o choro, mas sem soltar nenhuma lágrima. Não percebi quando curou, se foi cura ou esquecimento. Eu queria te contar como dói mais do que queria te contar sobre meu dia. Você me disse não vá pela dor, vá pelo amor. Eu queria tanto acreditar em você. Tanto que, às vezes, me convenço de que acredito. Você parece saber mais do que eu. E esses caminhos são diferentes? Há uma bifurcação? Das vezes que tentei, doeu tanto. É por isso que vivo engatinhando e fingindo estar de pé, usando um perfume caro e escondendo sob a maquiagem a imensidão das olheiras que amar me deixou. Um amor me deixou. Vários amores me deixaram. Eu os deixei em vingança. Sem cru, sem crueldade, nem frieza. Deixei por viver nessa incontrolável busca por algo que precise dos meus cuidados. Você me disse não bata a cabeça e não morra, e preserve seus lábios intactos - eu preciso encontrar alguma coisa que valha a pena, e pode ser você. E eu senti algo me segurar pelo mesmo braço que estava sendo puxado por um lado obscuro de loucura. Eu me senti cuidada. Foi quando eu percebi que eu preciso de alguém, e poderia ser você. Ou qualquer um. Ou qualquer rosto, ou corpo quente. Eu te escrevo como quem conseguiria dizer amor, mas eu não te amo. Eu te escrevo como se escrevesse para alguém capaz de me entregar amor - amor de um outro. É como se você soubesse todos os caminhos, inclusive o meu. Ontem eu saí desesperada, tropecei no tapete, mas mantive todos os meus fios de cabelo no lugar. Como você teria me pedido se, naquela hora, eu te contasse que estava prestes a vomitar, mas fui tomada pela precisão de um olhar trocado no meio de uma multidão de outros olhares ao avesso. Tenho aversão a tudo que me sugue. Mas em meio aquela confusão latente de tudo que pulsava do coração às artérias e movia rapidamente as minhas pernas, eu achei que tivesse encontrado alguém. Talvez eu tenha. Mas o temor falou mais alto, e eu me escondi. Depois fiquei me remoendo pensando na vontade de dizer coisas que ninguém nunca diria. Que ninguém nunca responderia de forma precisa. Imaginei que, se aquela corrida, tivesse dado certo, e não houvesse tropeço, eu teria alcançado o clímax de toda a minha história, o êxtase, o ápice de minha entrega. Por isso falei da minha aversão, repulsa, fobia, tudo. Ali eu fui sugada. Por carência ou desejo? Por desejo de não ser mais carente ou por carecer daquele olhar mais próximo ao meu? Eu imaginei eu e ele. Já havia imaginado antes, pois houveram tantos outros olhares trocados. Ele com sua camiseta vermelha, e seu cavanhaque emoldurando um sorriso tímido. Nós dois sentados na calçada imunda. E a vida sendo leve feito música. Me diz como era sua vida antes de me conhecer? Sã. E agora? Salva. Tenho mais medo de morrer amado, do que morrer louco. Tenho mais medo de morrer por amor, do que por loucura. Quando você vem me visitar?

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