terça-feira, 25 de junho de 2013

O tempo da delicadeza sem fim e em mim

Nostalgia s. f. vontade de voltar a algum lugar do tempo, sem voltar no tempo.

Noventa e seis horas sem dormir. Não consigo me lembrar da última vez que pensei em algo sem sentir a cabeça doer no ritmo do pensamento. Cada parte do meu corpo parece se desintegrar - lentamente. Não tenho sono. Deito, rolo, sinto frio e depois calor, tomo banho, chá, nada me faz parar. Estou cansado - mas não durmo.

Perdi a conta do número de vozes. Cada uma puxando e me arrastando e me esticando para um lado. Estou tonto, nauseado e uma pressão escorre da testa para os olhos.

Quero, preciso, mas não posso dormir. Me empurro para cama, mas não me permito. Tenho muito a pensar. Muito a ler. Assistir. E o tanto de coisas a serem sentidas? Lugares para serem visitados? Fico com minhas listas em mãos, meus blocos de anotação e cadernos, e se não der tempo?

A vida passa num piscar. O presente? Passou...passou...passou. Quanto ao passado, nada posso fazer se não me arrepender por não tê-lo vivido com mais dedicação - um dos motivos pelos quais estou desperto. Passou...passou...passou. Olhar para o lado - o presente já não está mais aqui.

Ele se foi. Ele não existe para mim - e para poupar ilusões, recomendo que não exista para você também. Foi uma criação para nos conectarmos ao agora - que, por conseguinte, também não existe. Passado e futuro - tudo o que temos. E continua passando, tudo.

Eu tenho pressa. Quantos livros consigo ler nas próximas quatro horas? Concentrado, só tendo olhos para as páginas e a garrafa térmica com café quentinho.

Meu estômago vai estourar - a esse ponto, pressão também escorrendo pela coluna.

Eu tento não me atrasar, não desperdiçar os minutos tão raros, mas não consigo escapar de pensar no que já vivi.

Eu penso nela. Nada a ser dito. Ficou um espaço, um vazio. Um final que se deu de repente. Uma imensidão de pontos. Que não se ligam mais - dispersos.

Fico repassando a imagem dela - mesmo da forma como o fim se deu, é ela a quem muitos dos meus pensamentos recorrem. Numa tarde de céu meio cinza e meio azul, sentada no parapeito do prédio, quando fazia um ano desde que havia perdido o pai. Ela ficava procurando pelo horizonte e encarando o chão. Eu conhecia a vontade dela de viver, então não senti medo. Mas ela olhava como se soubesse a exata sensação de pular dali. Como se saltasse os quatorze andares às vezes. O telefone tocou - pela vigésima vez na hora em que estávamos juntos. Ela disse "não vou atender". Eu insisti. Com muita calma, ela pegou o celular e o lançou para que a gravidade fizesse graça com ele.
- Eu não preciso que me liguem todo dia 6.
- As pessoas só se preocupam com você.
- Ele não morre uma vez a cada mês. Ele morreu em um dia e doeu pra sempre.

Quando ao pensar muito, penso em quem se foi. Na morte, e em como ela fica impregnada em tudo. 

Meu maior medo é esse - e perco a respiração só em pensá-lo:

medo

de

morrer.

Sem ter feito nada.
Sem ter feito tudo.

Eu não posso dormir porque não amei
todos a quem deveria.
Eu não posso dormir porque não amei
tudo o que deveria.
Eu não posso dormir porque tenho
muitos tios que
morreram
durante o sono.

Eu não posso dormir porque tenho medo.
E nos sonhos posso descobrir

que meu medo não é só esse.

"Fazia de tudo para não pegar no sono, para manter a alma dentro de mim, onde era seu lugar".

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