segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Um Quarto Para Estela.

Aqui acabaram os guardanapos. Usei todos, um por um. Na intenção de conter o que escorria de mim. Na verdade, usei todas as folhas que possuía. Sem me prender a suas finalidades. Tentei amenizar o estrago. Sujei toalhas, lençóis, panos de prato. Não me restou uma peça de roupa limpa. Nem espaço no varal. Continuei a ensopar os dois quartos do apartamento por uma semana, dois meses, três, quase cinco. Minha agonia continuou a se derramar sem culpa. Recebi seus elogios. Agradeço. Mas não consigo mais escrever. Isto já não pertence mais a mim. Não encontro um lugar comum entre o que penso, o que sinto, e o que me valerá de algo no futuro. Todo espaço em branco que encontro, preencho com alguma frase que o deixa vazio. Sigo sendo um fantasma sem que ninguém perceba. Uma alma penada vagando entre as pessoas, talentosamente fingindo ser uma delas. O que quero te dizer? Um bom tempo se passou desde que ouvi de você pela última vez. Um bom tempo passou. E só ele. As outras coisas permaneceram as mesmas. A mesma máquina de café que, toda vez quando ligada, ameaça explodir. Os mesmos travesseiros murchos na cama. O mesmo sofá. As mesmas amígdalas inflamadas. Nada passou, além do tempo. Passou por mim e através de si mesmo. Pelo menos, tenho tido mais oportunidades para pensar. Especialmente durante o banho. Nunca cheirei tão bem. Eu me permito pensar, e repassar, em tudo. Não me imponho limites. O que não quer, necessariamente, dizer que eu faça bom uso da minha liberdade. Eu não sei onde guardar coisas que são maiores que eu. Liberdade na sala. No banheiro. Entre a tela e o vidro da janela. Em uma estante. Onde cabe a liberdade? Não quero iniciar uma discussão. Não tenho quereres, afinal. Escrevo agora por ter encontrado um espaço em branco. Escrevo e o transformo em vazio. Não sei que dor me deu nas costas, mas precisei ficar de cama por longos dias. E é diretamente dela que te comunico: haviam guardanapos esquecidos debaixo do colchão. E eu aqui a procura de espaços. Encontrei quase quinze desses. E a descoberta me animou tanto que precisei te agradecer. Obrigada. Muito obrigada. Achava não que nada mais me cabia, mas que eu mesmo já não cabia ao mundo. Dizem que este é um dos quadros da depressão. Eu só posso dizer que adoraria ver a totalidade de suas obras. A depressão realmente pinta muito bem. Sabe trabalhar muito bem com a sombra. E se dedica de corpo e alma a seus quadros. Hoje, raramente, vejo artistas de verdade: tão entregues. Em compensação, vejo muita gente se querendo para a melancolia. As pessoas entendem o que realmente é sofrer? E que isso demanda muito? Sofrimento tem de ser visceral, atravessar as dermes, as tripas, a alma. Quanto do seu próprio peso cabe a alma? Quanto do meu peso responde por mim? Não sinto saudades. Não sei bem o que sinto. Talvez mais nada. Existe um período em que flutuamos, acho que o que chamam de "estado de choque". Não entendo o que querem dizer com isso. Mas também não me importo. Eu só sei que a cafeína tem me caído muito bem, e eu tenho ficado de pé.

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