segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

Algo mais sobre o amor

6h15
Eu me levanto. Mas ainda não me sinto de pé. Corro para o banheiro, onde lavo meu rosto de duas a três vezes, antes que ele me veja, às 6h20, quando se levanta. É que acordo cheia de remela ao redor dos olhos. E a pele toda seca, quase rachada, especialmente em volta do nariz e da boca. Há uns dois anos, acordo com essa dor de cabeça de quem chorou por horas. De quem secou por dentro e paga o preço por fora. Há cerca de seis meses descobri que a dor de cabeça era mesmo de quem havia chorado por horas. E pior, era mesmo minha. Havia um diagnóstico para minha dor, mas não para o meu choro.

Eu me deito todo dia um pouco antes das 23h, às vezes me empolgo com um livro e durmo lá perto já de 00h. E sempre acordei já lá pras 7h. Assim que ele batia a porta de casa e saía para o trabalho. Mas todo dia, há seis meses, acordo antes, às 6h15, corro para o banheiro e me limpo. Ele nunca foi de me amar tanto ao ponto de me assistir dormir. Então tenho quase absoluta certeza de que nos primeiros um ano e seis meses desses dois anos em que acordo com dor de cabeça de quem chorou por horas - e chorei -, ele nunca tinha me olhado dormir e tinha me visto toda coberta de lágrimas e remelas. Mas nesses últimos seis meses, desde que descobri, tenho tomado cuidado para que ele nunca perceba. Vai que, um dia, ele resolvesse me olhar em sono. Acordo, portanto, cinco minutos antes que ele acorde e me recomponho - fica só a dor de cabeça como prova do sono em choro.

Não faço barulho enquanto choro e durmo. Fiz o meu médico passar a gravação sete vezes para termos certeza. As lágrimas caem aos montes, mas o único barulho que elas me causam e o delas mesmas escorregando por minha pele já cheia de relevos.

Eu acordo mais cedo e me lavo e me limpo porque não quero que ele me veja devastada da maneira como acordo. Não quero que ele se assuste. Porque não vou saber localizar geograficamente em mim de onde vêm essas lágrimas. Estamos há quase dez anos juntos, e eu ainda vivo cercada pelo medo de que, um dia, ele me olhe e se assuste.

Esse medo constante do qual quase todos sofremos: de que quem nos ame vá embora.

- Ah, mas quem ama não se assusta e, simplesmente, vai embora. Isso não é amor.

Isso não é amor. Mas o que é amor, se não isso? Os dias tem 24h, e nós nos conhecemos, com sorte, antes dos vinte e cinco, e nos casamos antes que eu engravidasse. Não engravidei, aliás. O que aumentou, consideravelmente, o perigo eminente de um susto seguido de uma partida.

Não parta, senão serei partida.

Não sei, de coração, o que choro toda noite enquanto durmo. Eu já sofri demais, mas nada que não fosse característico da vida: sofri com a efemeridade das coisas, a comprovação de que tudo se desfaz, tudo se acaba, tudo se morre, tudo se termina.

Há seis meses eu sofro com o medo de que ele se assuste e me deixe. Nos um ano e seis anteriores, eu só sofria com a dor de cabeça. As dores físicas são, certamente, mais fáceis de lidar. Claro que para tê-las existiram antes as dores de alma - e quais, afinal?

Não sei o que me faz chorar toda noite, em sono. Deve ser algo que me faz chorar todo dia, mas que não vejo no reflexo das janelas dos ônibus, nem nas poças d'água que se acumulam debaixo dos aparelhos de ar-condicionado dos prédios.

Não sei qual caminho percorro. Não sei por qual caminho me sofro.

Eu não posso deixar ele partir, porque eu mesma serei a partida. E aí eu vou ser só choro em sono ou só sono em choro. Se ele me deixar eu não sei...vai que de repente eu começo a sorrir. E acorde com dores na bochecha de tanto riso.

Há seis meses eu fujo de mim para fugir dele.



3 comentários:

Anônimo disse...

Poxa vida Julianna!!! Você transborda amor, ver esse sentimento pelos seus olhos é tão maravilhoso que me falta o que falar!! Sou fã ♥

Luísa Zanni disse...

Caaaaaaaaaaraaaaaaaaaalho. o_o

Isso que eu chamo de reviravolta, mulher. Taí... E quando a coragem pra ficar é só medo de ir embora? Que que a gente faz? Inventa desculpas malucas por não conseguir olhar pra si. Se ver só. Se ver feliz.

Que loucura!

Geovanna Machado disse...

pesado!