segunda-feira, 16 de julho de 2012

O Retornar Tardio.

Estive ausente, mas não faltou vontade. É que surgiram calos, e por vaidade resolvi poupar meus dedos das canetas, lápis, teclas, e todos os outros instrumentos do tipo. Por vaidade, também, prolonguei o "descanso" e deixei que sentisse minha falta. Que sentisse tanta, mas tanta, falta minha, que depois eu pudesse vir até aqui e dizer: segure as águas, voltei. E isto então fosse possível. Segure-as então. Sem choro, sem violência, sem rancor algum. É assim que precisa se realizar nosso reencontro. Muita calma. Pois é da ausência que nascem os sentimentos mais sinceros. É na falta que os sentimentos se tornam menos dependentes uns dos outros e, assim: mais claros.  Ao contrário do que pensam, a reclusão não me causou náuseas, e nem arrepios. Houve sim muita melancolia. Muitas noites de insônia, e algum descontrole. É que eu tenho sim esse espírito de poeta. Essa vontade de ser livre, de ser dispensado das explicações. Eu não trouxe muita coisa comigo. Só a vontade de fazer desta, uma carta única.
Boa tarde - é, normalmente, o horário em que os carteiros passam por aí, correto? Como vai? Melhorou das dores de cabeça? Enjoou de tanto comer doce? De tanto se sentir insatisfeita consigo mesma? Tomou coragem e procurou ajuda? Foi de algum uso? Diminuiu o número de cigarros? Sentiu falta de acabar escondida com meus maços? Melhor que tudo isso, sentiu minha falta?
Tem uma coisa que eu nunca te disse. Uma coisa que eu sempre soube, mas que meu egoísmo camuflou nas noites em que nos debulhávamos entre taças de vinho e fados. O problema não era você, nunca foi. Nem eu. Quem era eu? Além de um corpo certamente disponível para estar, sem dúvidas, completamente nu ao seu lado na cama? Eu era a certeza de que você nunca precisaria cair no sono sozinha, a menos que desejasse isso. Voltando, o que eu nunca te disse, é uma das coisas mais básicas para uma sobrevivência, pelo menos, justa. Você não precisava comprar Merlot, se preferia Pinot Noir, só porque eu não gostava de Merlot. Antes de tudo, você não precisava tomar vinho só porque eu não suportava cerveja. Você deveria ter me dito, de primeira, que tudo o que havia na geladeira era cerveja, e se eu não estivesse satisfeito com isso, que eu fosse buscar um vinho. E caso você mesma trouxesse um vinho, por espontânea vontade, e este não fosse da uva que prefiro, me fizesse bebê-lo assim mesmo, sem frescuras. E ainda me humilhasse o suficiente para que eu achasse este vinho o melhor do mundo. E, eventualmente, eu acharia. Porque o humano é o ser da adaptação. E você nunca deveria ter se deixado anular tanto só para me deixar satisfeito. Que eu aprendesse a me satisfazer só por estar vivo. Só por estar na presença de alguém que me queria satisfeito - mesmo que em meios práticos, não tenha conseguido. Que fique mais do que claro o conselho que te escondi por todos esses anos, só por idealizá-la meu amor e minha "súdita": ser prioridade na sua própria vida. Mas claro, nunca deixe de ajudar os outros. Contanto, obviamente, que ajudá-los não te atrapalhe consideravelmente.
Deve estar pensando que o tempo ocioso me proporcionou a leitura de auto-ajuda. Já antecipo que não toquei em nada disso. Cabeça vazia é oficina do coração. E por isso voa e alcança planos tão altos que, às vezes, perdemos totalmente a lucidez.
A culpa não foi sua. Eu precisei ir, e fui. Mas te acompanhei de longe. Eu te vi perder o rumo, mas correr atrás. Se tem algo que eu quero pedir, é para que não se destrua, ou descabele, por ninguém não. Dê sempre um jeito de encontrar a calma, ou alguma forma de paz.
Quem veio primeiro, o amor ou o medo?
Não custa fingir que tudo tem resposta, para reduzir a ansiedade que dá só em estar vivo.
Sendo amor, ou medo, sendo um primeiro, o outro segundo, ou os dois de uma vez, eles sempre encontram a saudade. Já viu isso? O amor dá saudade até mesmo na presença. O medo dá medo até da saudade - medo de que ela só se sinta na ausência.
Melhor diminuir logo as luzes e aceitar que já é noite. De alguma forma estas palavras chegarão a você, e de alguma forma você as receberá. Com susto ou felicidade. Com qualquer outra coisa que não me ocorra agora.
Só vim para dizer que nunca fui.
Só vim para mostrar que estive aqui.
Será se ainda se lembra?
Será se percebeu?
Que continue sendo belo.
Eterno.
Que tenha sido amor.
Que nunca tenha medo.
Que não perca esta pureza.
A pureza do amor prematuro - que nasce antes do tempo certo.
A pureza do amor prematuro - que nasce antes do tempo certo. E que, às vezes, sobrevive.

2 comentários:

Ana disse...

Seja lá quem você for, te amei por três minutos te imaginando em outrem... Enfim, é isso aí: Parabéns pelo texto.

Anônimo disse...

Te achei! Te achei, te achei!